Nas palavras de Nizo Neto, outro Mestre da dublagem: "O Orlando criou uma escola... Todo dublador sabe dublar o Scooby... Tá no sangue"... |
A história centenária do ator e dublador Orlando Drummond, o Seu Peru da "Escolinha do Professor Raimundo" é contada em detalhes no livro "Orlando Drummond - Versão Brasileira", de Vitor Gagliardo... Apesar de o personagem ter repetido com frequência ao ser chamado pelo professor a frase "Peru com mel de Vila Isabel" – esse e “Use-me e abuse-me, teacher!!!” - Orlando nasceu no dia 18 de outubro de 1919, na região de Todos os Santos, zona norte do Rio, e morou no Rio Comprido, Piedade, Tijuca, São Cristóvão, Lapa e Glória antes de se estabelecer em Vila Isabel, bairro fundado pelo barão de Drummond, que o professor Raimundo dizia ser seu avô, embora o autor aponte não haver parentesco entre eles... Influenciado pelo avô João - esse sim faz parte da irmandade, quer dizer, da árvore genealógica da família - um dono de padaria, o pequeno Orlando passa a torcer pelo Bacalhau e a frequentar o estádio de São Januário... Mas só até o dia que em um jogo com o Fluzinho ficou impressionado com o volante Fortes, que roubava a bola dos adversários na base da dedada e virou pó-de -arroz... Praticante de boxe (onde adotou o apelido de “Mole-Mole”...), futebol (era zagueiro, "beque de espera"...) e remo (aqui por influência parterna, nas regiões da Quinta da Boa Vista e da Glória...), Drummond compareceu pessoalmente à Copa América de 1946, realizada na Argentina, e envolveu-se na briga generalizada que começou no campo e alçancou as arquibancadas no jogo decisivo entre brasileiros e argentinos - vencido, terminado o tumulto, pela Argentina por 2 a 0... Quatro anos depois, mesmo sem ingresso, introduziu-se no meio da multidão que forçou a entrada no Maracanã antes da partida com o Uruguai, que decidiu a Copa do Mundo de 1950... A derrota do Brasil por 2 a 1, de virada, deu a Orlando a fama de “pé-frio” em jogos da Seleção Brasileira... Ou como diria o Seu Peru... “Cruzes!!!”... Sem entusiasmo pelos estudos, Drummond trabalhou como entregador no armazém de um tio, vendedor numa loja de camisas e em outra de chapéus e prestou concurso para escriturário do Ministério do Trabalho, onde ficou por pouco tempo... Na região da Lapa, onde foi vigia de posto de gasolina, foi ajudar dois amigos a resgatarem de uma briga de bar um colega deles, apelidado de Camarão - sem alusões à mãe dos presentes, Bertoldo... Orlando, que deveria socorrer o amigo dos amigos, começou a bater em Camarão, que não conhecia... Camarão, que era policial, pensou em prender Drummond, mas os amigos disseram que ele havia comparecido ao bar para tirar ele da briga e os dois se tornaram amigos... Inclusive Camarão apresentou ele ao cantor Moraes Neto, que ao saber de suas imitações de vozes e de animais, o indicou para Olavo de Barros, diretor de rádio teatro da Rádio Tupi, que o empregou como contrarregra em 13 de agosto de 1942... "Ser contrarregra me ajudou na minha formação de dublador... O dublador é um contrarregra de boca... Ele precisa cobrir com exatidão as falas... Todos os efeitos são produzidos pela boca do ator", disse ao autor... No começo de 1946, depois de muita insistência, fez um teste para radioator com Paulo Gracindo, o próprio, e foi aprovado... A lista de programas que participou desde então, como contrarregra e radioator, abrange a fase áurea do rádio brasileiro... “Grande Theatro Eucalol” (1946), Rádio Sequência G-3 (1947) – em que Paulo Gracindo criou para Orlando o personagem Fifico Papoula, gay que foi uma espécie de “precursor” do Seu Peru – “Programa Manoel Barcelos” (1947) – no quadro “Palácio dos Veraneadores” – “Incrível, Fantástico, Extraordinário” (1947) – o clássico de Almirante – “Programa dos Comerciários” (1947), “Na Corte do Rei Xaxá” (1949) - criado por Haroldo Barbosa, que via no ator um astro que surgia, e onde fez o Ministro Cara Cheia – “Rua da Alegria” (1949) – interpretando o grã-fino Lúcio – “Cine Grátis” (1950) - de Leon Eliachar – “Grande Circo Detefon” (1950) - vide elefante de prêmio – “Recruta 23” (1950) – como o Sargento Seu Sarjo – “Um Dia na Feira” (1952) - de Castro Barbosa, fazendo o feirante Enxolino Sacoso... Em "Uma Pulga na Camisola", de 1953, criação de Max Nunes, interpretou o índigena Taco, colega de Pataco - tipo resgatado por Maurício Sherman no "Zorra Total" em 2000... A fama lhe rendeu participações nos filmes “O Rei do Movimento” (1954) e “Angu de Caroço” (1955), ambos os dois estrelados por Ankito, com quem integraria muitos anos depois o elenco do “Zorra Total” na TV Globo, Maurício Sherman... No rádio, continua a trabalhar forte nos programas de Max Nunes : “Hotel da Sucessão” (1955)- paródias “políticas” de músicas também estariam no antigo “Zorra”, Sherman – “Marmelandia, O País das Maravilhas” (1956) - nome que Sherman, sempre ele, usou no quadro dos peixes no "Zorra Total" em 2007, onde as paródias continuavam presentes, vide “Sputneka”, marchinha sobre a corrida espacial entre Estados Unidos e União Soviética que foi o maior “hit” do Carnaval de 1958 – “Ali Babá e os 40 Garçons” (1956) - no qual, além de cantar, interpretou o japonês Tacananuca... Sendo que a atração ganhou uma versão televisiva em 1957... Nesse mesmo ano, em “Semanascope”, cantava paródias de sucessos musicais da época - algumas feitas por ele, como as de “Saudades da Bahia” e “Com que Roupa”... Em setembro de 1958, a Rádio Tupi iniciou uma parceria com a Mayrink Veiga, onde trabalhava um jovem promissor chamado Francisco Anisio, vide “Caleidoscópio”, apresentado por Carlos Frias... Então é por isso que em 1960 ele se torna diretor da Mayrink, onde lança o programa "A Turma da Maré Mansa" e participou de "Vai da Valsa", de Haroldo Barbosa, no papel de Valentão - que levado para a televisão, ainda em 1960, foi dirigido na Tupo por Maurício Sherman!!!... A passagem pela Mayrink foi curta, e logo Drummond estava de volta à Tupi... Embora preferisse atuar no rádio, Drummond trabalhou forte na televisão nos programas "Espetaculos Tonelux", mais especificamente na fase da Tupi, em 1963 e 1964, em que ficou famoso pela imitação de Janio Quadros, "Riso Sinal Aberto", na recém-inaugurada Globo, em 1966 - olha o Sherman aí de novo - e na Tupi, em 1970, “Café Sem Conserto”, “Pisulino” - com Renato Aragão, Dedé Santana e, no quadro "Os Irmãos Max", com Mauro Gonçalves... Ah, sim... Pisulino era um boneco de ventríloquo criado pelo ator italiano Raffaele Pisu, contemporâneo do rato Topo Gigio - que no Brasil se apresentava na Globo, Agildo Ribeiro... Na Tupi, Pisulino (nome adotado na Argentina e no Brasil, no original ele se chamava Provolino...) contracenava com a cantora Rosemary... Quanto a Orlando, em 1971, o ator atuou nos filmes "O Doce Esporte do Sexo", protagonizado por Chico Anysio, e "Bonga - O Vagabundo", estrelado por Renato Aragão... Depois disso, só retornaria ao cinema em 2006, em dois filmes de “terrir” de Ivan Cardoso, “Um Lobisomem na Amazônia” e “O Sarcófago Macabro”... Nesta produção ele fazia um sacerdote do Egito Antigo... Podia fazer um arqueólogo, como naquele episódio do “Trapa Hotel”, em “Os Trapalhões”, em 1990, digo...
Na temporada de 1988 do "Chico Anysio Show", Seu Peru trabalhava forte no balé com Rodolfo, filho do bicheiro Osvaldão... |
O trabalho forte de Orlando Drummond com a dublagem começou em 1948, com pequenas participações nos longa-metragens de animação de Valdisnei lançados nos cinemas brasileiros... O convite veio do próprio diretor de dublagem, o compositor João de Barro, mais conhecido como Braguinha... Que apostava em atores de radioteatro para a função... As falas eram gravadas na Sonofilms, no Rio, porém a mixagem com as imagens era feita no exterior, geralmente no México, onde Valdisnei dublava seus filmes em espanhol... Foi assim que em 1955, ao dublar o experiente cão Caco, de "A Dama e o Vagabundo", o ator deu início a série de personagens caninos para os quais emprestou a voz... Embora tenha ficado famoso por imitar galos cacarejando na rádio Tupi e o seu melhor desempenho ao dublar animais seja com papagaios, Pancada... Em 1959, por indicação de Maurício Sherman, seu velho conhecido da Rádio Tupi, Drummond dublou para a empresa ZIV o Porthos da série "Os Três Mosqueteiros"... Pouco depois, recebeu uma proposta de Herbert Richers, o próprio, para atuar na dublagem da série "Zorro", de Valdisnei, primeira produção a ter sua versão brasileira feita pelo estúdio de Richers... Orlando fez a voz do sargento Garcia, numa atuação que impressionou o próprio intérprete do personagem, Henry Calvin, que esteve no Brasil em 1970... E quis conhecer Drummond, apesar de sua voz ser aguda e a do dublador mais grave... Foi no início do trabalho forte de Drummond na dublagem, principalmente na Herbert Richers -matrícula 1132 - mas também em outros estúdios, como Riosom, Tecnisom e Peri Filmes, onde também foi diretor de dublagem... Voltou a atuar em filmes de Valdisnei - coruja Arquimedes em "A Espada Era a Lei", em 1963, o anão Atchim, na redublagem de "Branca de Neve e os Sete Anões", em 1965, o Cocheiro, na redublagem de "Pinoquio" feita em 1966, o cachorro Lafayette, de "Aristogatas", lançado no Brasil em 1971, o urso João Pequeno, de “Robin Hood”, produzido em 1973, um dos corvos e o dono do circo nas dublagens de Dumbo feitas em 1973 e 1998, o marinheiro Smee, de "Peter Pan", o mago Dalben de "O Caldeirão Mágico" - e teve papéis importantes em filmes de sucesso... Vide Doutor K em em 13 filmes do agente secreto James Bonde, o detetive Jimmy “Popeye” Doyle em “Operação França”, Amerigo Buonasera em “O Poderoso Chefão”, padre Lankester Merrin em “O Exorcista”, “Capitão Ross” na versão de 1976 de “King Kong”, Garganta Profunda em “Todos os Homens do Presidente”, o marinheiro Paddy Burton em “A Lagoa Azul”, comandante Lassard em “Loucademia de Polícia”, Marvin Acme em “Uma Cilada para Roger Rabbit”, Comissário Gordon no “Batman” de 1989, o milionário que não poupa despesa John Hammond em “Parque dos Dinossauros” – na dublagem da Herbert Richers, pois como registra o autor, o filme de Steven Spielberg também foi dublado pela Álamo e pela Delart, situação que se repete em vários filmes – o capitão Edward Smith em “Titanic”... Em 1966, Orlando dublou pela primeira vez na Herbert Richers o marinheiro Popeye, função que exerceu no estúdio até 2000, o que inclui a versão do filme de 1980 exibida na Globo... E levou Drummond a encarnar o personagem em um memorável esquete da Agência Trapa Tudo, em "Os Trapalhões", na temporada de 1992 - o livro não fornece a data exata, porém o quadro foi gravado numa época em que o elenco da "Escolinha do Professor Raimundo" era constantemente escalado para participações no humorístico por influência do supervisor da atração, o próprio Chico Anysio, para tentar contornar a queda de audiência que vinha desde a saída de cena de Zacarias em 1990... Popeye comparece a Agência com sua "sócia" Olivia Palito, vivida por Zezé Macedo, convidado por Dedé para participar de uma série a ser vendida para a Globo, com o Homem Elástico... No caso, Didi, que tenta "negociar" com Olivia até ser "amarrado" pelo marinheiro...Em 1972, dublou, inicialmente na Dublasom Guanabara, depois de um teste onde fez os latidos com que espantou os gatos que rondavam a casa onde morou na região da Glória, o cachorro Scooby-Doo... Que defendeu por quatro décadas, apesar de seu dono Salsicha ter sido interpretado por cinco dubladores diferentes - Mário Monjardim, César Marchetti, Orlando Prado, Marco Ribeiro e Manolo Rey... A atuação de Orlando como o cachorro dos desenhos da Hanna Barbera se tornou uma referência no meio da dublagem... Ou como disse Nizo Neto ao contar quando substituiu Drummond em uma fala de "Scooby-Doo 2: Monstros à Solta", de 2004: "O Orlando criou uma escola... Todo dublador sabe imitar o Scooby... Tá no sangue"... Depois de Scooby vieram outros personagens caninos da Hanna-Barbera (e da Ruby Spears, produtora fundada pelos criadores de Scooby-Doo e depois adquirida pela própria Hanna Barbera...), como Bibo Pai (em "A Arca do Zé Colmeia"...), Hong Kong Fu, Bionicão, Kojeka, Yogui, Assombroso... Bom, esse era um fantasma que contracenava com o Gasparzinho, digo... Desenhos animados foram uma constante na longa carreira de Orlando como dublador – Loki em “O Podeoso Thor”, JJ Jameson em “Homem Aranha”, doutor Banner em “Incrível Hulk”, Garila em “George, O Rei da Floresta”, Buba em “Os Tremendões”, Coisa do Quarteto Fantástico em “A Coisa”, Dom Quixote no desenho espanhol baseado na obra de Cervantes, Ernesto Penaforte em “Danger Mouse”, Pacato e Gato Guerreiro em “He Man”, Abeleão em “Wuzzles”, Corujão em “As Novas Aventuras do Ursinho Puff” – Geraldo Alves dublava o protagonista – professor Girassol em “As Aventuras de Tintim”, Puro Osso em “As Terríveis Aventuras de Billy e Mandy”, Senhor Coelho em “Mansão Foster para Amigos Imaginários”... A versatilidade de Drummond era tamanha que os produtores estaduinidenses da Warner compareceram ao Brasil para conferir de perto o trabalho forte do ator que fazia as vozes do Frajola e do Patolino... Também em séries Orlando compareceu... No começo da década de 1980, dublou Max, o mordomo dos Hart em "Casal 20"... O texto da abertura da série, lido com a inflexão do Popeye, é um clássico... Pena que o "Livro das 1001 séries de TV" tenha optado pela tradução literal das palavras de Max... Em 1987, começou a dublar o alienígena Alf... Para quem deu "um jeitão meio carioca" e criou o bordão "Tá limpo"... Faltou citar que na paródia "Alf, O ETremoços", exibida na "TV Pirata" em 1988, o personagem tinha sotaque português... Junto com Popeye e Scooby-Doo é um dos trabalhos mais icônicos de Orlando como dublador... Então é por isso que Galiardo começa o livro com uma frase que define como mantra... “Todo dublador tem um Orlando Drummond dentro de si... Orlando foi contratado da Herbert Richers até o fechamento do estúdio, em 2010... Ao contrário do que aconteceu com a rádio Tupi, Drummond não quis processar a empresa, em consideração a seu fundador, que saiu de cena em 2009... Embora tenha participado como tesoureiro da primeira diretoria da associação de dubladores do Rio, em 1965, na greve dos dubladores de 1978, Drummond não aderiu ao movimento e acabou incluído numa lista de 34 profissionais que foram expulsos do sindicato quando a paralisação acabou... Porém, como diretor de dublagem, incluiu atores que participaram do movimento e estavam em listas das empresas para não serem contratados... Mudanças na convenção coletiva de trabalho em 2003 favoreceram a criação de novos estúdios de dublagem e tiraram mercado da Herbert Richers... Que devido à dublagem das novelas mexicanas do SBT (que Drummond participou "sem muito protagonismo", de acordo com Gagliardo...) precisava manter um número muito grande de atores sob contrato, já que Silvio Santos exigia que as vozes não se repetissem com frequência, o que segundo o relato do dublador Ricardo Schnetzer, levou a empresa a falência... Orlando deixou de dublar o Scooby-Doo em 2012, por decisão da Warner... O livro não aponta nenhuma razão específica para a mudança, embora mencione que a medida pode ter relação com questões de pagamento de cachês, a idade de Drummond - que na ocasião já tinha 93 anos - e o desejo da produtora de que as vozes brasileiras fossem mais próximas das originais... Que não se pronunciou oficialmente sobre a mudança, embora o livro aponte que podem ter influenciado na decisão... O novo dublador do personagem, Reginaldo Primo, relata que lhe foi pedida uma interpretação diferente da feita por Orlando... E o resultado ficou próximo ao do original estadunidense, apenas um pouco mais grave e abafado... O ator deixou de atuar nas novas dublagens, mas nos brinquedinhos vendidos pela Burger King ©, ele continuou a falar “Scooby Dooby Doo!!!” e “Salsicha!!!”...
Na "Escolinha" do "Chico Anysio Show", em 1989, Seu Peru não era chamado pelo professor, mas comentava respostas de colegas... |
Em 1982, por sugestão de Chico Anysio, Orlando Drummond foi contratado pela Globo para dirigir a dublagem do quadro de Bruce Kane, no "Chico Anysio Show"... A convivência seria importante para um assistente de produção que estava se iniciando em dublagem - o filho de Chico, Nizo Neto... O vínculo definitivo com a emissora viria por meio de Maurício Sherman, que inicialmente o chamou para um programa com Bibi Ferreira... Também dublava, óbvio... Um exemplo é a chamada do filme "O Espião que foi para o Frio", onde fazia a voz de Carlos Kroeber, um funcionário da alfândega soviética que debochava de Bruce Kane por levar maquiagem na mala - "os porcos capitalistas americanos não perdem o senso de humor" -um truque para que a bagagem da agente que o acompanhava não fosse revistada... Algum tempo depois, Nizo passou no teste para fazer a voz de Presto na série “Caverna do Dragão”... Série de animação em que Drummond era o dublador do Vingador... Um vilão que se levava muito a sério, ao contrário do bruxo Gargamel no desenho “Os Smurfs”... Segundo o autor, a atuação de Orlando, diferente da voz original pelo tom “mais viril, mais maléfico, é como se houvesse ódio em cada palavra”, foi tão marcante que aos 99 anos de idade ele foi chamado para dublar o vingador num comercial da Renault... Uma versão “live-action” do desenho feita para vender o compacto Kwid Outsider... De volta ao programa de Chico, Drummond começou a atuar em alguns quadros - fiscal sanitário que comparece no “Abaitolá” de Painho, sultão que faz a contagem das mulheres em seu harém, homem de alta sociedade que em uma festa vai namorar com dois rapazes em uma garagem (!!!) - onde também fez a voz de Jorge, o cachorro malufista do personagem Bolada, em 1986... Na temporada de 1988, o quadro da "Escolinha do Professor Raimundo" passou a contar com 20 alunos, também para aproveitar o elenco que vinha do "Viva o Gordo" - Jô Soares se transferiu para o SBT no final de 1987... Para a nova temporada do programa, Chico criou, entre outros personagens, um gay, o Seu Peru, que foi oferecido a outro ator... O qual, ao colocar o figurino e começar a ensaiar, não se sentiu confortável com o personagem e desistiu do papel, poucos dias antes do início da temporada de 1988... Conforme a diretora Cininha de Paula relatou para o autor, o próprio Chico sugeriu então que Drummond fizesse o personagem... Disseram que seria uma participação pequena, mas ele hoje ele se sente feliz por ter sido enganado, digo... Chico criou o tipo, porém os bordões ficaram a cargo de Drummond... De fato, a "Escolinha" com 20 alunos começou em 1988 - o primeiro programa da temporada passou em 6 de abril - no entanto, Seu Peru compareceu em outro quadro, o do bicheiro Osvaldão, exibido em 20 de abril... No qual trabalhava forte como o professor de balé de Rodolfo, o filho do bicheiro, vivido por Felipe Martins... Todo de rosa, de legging e uma faixa na cabeça, o próprio coreógrafo... Ao ver Rodolfo com o pé quebrado, diz que "a academia vai dar o maiorrrr" apoio.. Semanas depois, já usando echarpe e casaco lilás, um visual mais próximo do usado na "Escolinha", Peru se insinua para o primeiro ruralista de Rodolfo (papel de David Pinheiro), também dizendo que, se precisar, vai lhe dar "o maiorrrr apoio"... Em um texto reproduzido no começo do livro, Drummond aponta que começou na "Escolinha", ainda no "Chico Anysio Show", em 1989... E de fato, as primeiras aulas assistidas pelo Seu Peru aconteceram na temporada de 1989 do “Chico Anysio Show”, conforme demonstram os programas exibidos pela Globo Portugal... Ele não chega a responder nenhuma pergunta, mas sempre tem um comentário afiado sobre as respostas dos colegas de classe... Quando João Bacurinho (Olney Cazarré...) conta que para não perder o jogo do Coringão tomou um táxi dirigido por um chofer gay, Peru se pronuncia: “Até que enfim ganhei um acompanhante... Não sei se percebes, mas ele está contigo porrr aqui”... Peru volta a intervir quando Bicalho (Antônio Pedro Borges...) diz que Maria Antonieta usava o desodorante íntimo Flor da Bastilha: “Com licença, aliás, deliciosamente, eu vou tentar usar esse desodorante para ver se tenho o maiorrr apoio”... E quando o professor pede para ele sentar, dispara: “Tá vendo???... Ele está comigo porrr aqui”... No programa seguinte, quando Peru concordou com a reclamação do professor sobre o pitaco que Ptolomeu (Nizo Neto...) deu na resposta de Marina da Glória (Tássia Camargo...): “Metido que só ele, eu não lhe dou o menorrr apoio”... Novamente, o professor Raimundo pede que ele se contenha: “Eu não lhe perguntei nada”... “Já vi que o senhor está comigo porrr aqui”, responde Peru... Na próxima aula, quando Cacilda (Cláudia Jimenez...) diz não acreditar na lenda do boto cor-de-rosa que seduz donzelas, Peru solta a língua: “Professor, essa mulherzinha me dá náuseas, se quiser dar um zero eu dou o maiorrr apoio”... De novo, Raimundo corta o papo: “Olha, se o senhor bobear quem vai levar o zero é o senhor”... “Já vi que o senhor continua comigo porrr aqui”, conclui Peru... Nos programas seguintes, achou lindo o som de trovão feito por Bicalho, pediu castigo para outro pitaco de Ptolomeu, considerou merecido o zero de Eustáquio (Grande Otelo...), separa uma briga entre Bertoldo Brecha (Mário Tupinambá...) e Cacilda quando ela faz menção ao camarão, que é o apelido do colega, dá o maiorrr apoio ao professor caso queira expulsar Cacilda por sua proposta indecorosa – e Raimundo ameaça expulsá-lo – considera “inteligentíssimo” o anúncio da “Avícola do Pinto” feito por Bicalho, critica as intromissões de Ptolomeu – o professor pede que só fale quando solicitado – e o zero dado a Eustáquio, diz que a propaganda da Rainha das Tintas de Bicalho, citando pincéis, brochas e espátulas, é “insinuante” – e ao ouvir Raimundo lhe mandar calar a boca, detona: “Cruzes, falou em voz alterada, está comigo porrr aqui” – e dá o maiorrr apoio ao repente de Aderaldo (Artur Costa Filho...) sobre os anfíbios, mas só a parte em que eles não recusam macho... Ops!!!... Seu Peru estava lá quando o quadro virou programa, em 4 de agosto de 1990, um sábado à noite - depois que o humorístico foi cancelado devido à concorrência com a novela "Pantanal" - e mais adiante, em 28 de outubro de 1990, quando começou a ser apresentado nas tardes de segunda à sexta... Sempre aproveitando as perguntas do professor para revelar que alguma personalidade histórica é "moça, moçoila, mocérrima" e levar mais um para a irmandade... Mesmo quando Chico cogitou tirar o personagem de cena, devido a críticas que consideravam o tipo impróprio para o horário vespertino - e de fato ele ficou afastado das aulas no segundo semestre de 1992, vide ausência no amigo oculto exibido em dois dias no Natal daquele ano - Drummond seguiu superando a dificuldade de pintar os cabelos com uma elogiada capacidade para improvisar textos, dizendo o próprio telefone em cena e rindo como o Scooby-Doo das piadas dos colegas... Que também tentava levar para a irmandade, vide música "Fuxicos da Ciranda do Peru", de 1991... Em meio aos improvisos em cena surgiu a famosa rivalidade com o Seu Gaudêncio, o "macho-chô" vivido pelo cantor Ivon Curi... A interação entre Peru e Gaugau funcionava tão bem que Orlando e Ivon excursionaram durante quase três anos com o espetáculo "A Santíssima Trindade"... Tambem participou de apresentações em eventos com os shows "Seis com Vo... Cêis", com Anne Marie, Brandão Filho, Marcos Plonka, Rogério Cardoso e Zezé Macedo, além da peça "Expulsos da Escolinha", com Nádia Maria e Tutuca... Quando era possível, Chico encaixava nos programas algumas demonstrações de dublagem de Orlando, seja pedindo para ele fazer a voz do professor ou do Ruy Barbosa Sá Silva (José Vasconcelos...) ou quando falava como Popeye ou Max... Sempre preocupado com as mudanças que Chico fazia na "Escolinha" a cada início de ano - que viraram a recorrente piada interna da "lista" em 1993, Drummond foi conversar pessoalmente com Roberto Marinho, o dono da Globo, quando o programa saiu do ar em 1995, pedindo que mantivesse seu contrato com a emissora, apesar de seu principal rendimento vir da dublagem... Chico Anysio, por sua vez, o aproveitou em seus novos programas - "Chico Total" em 1996 e "O Belo e as Feras", em 1999... Então é por isso que no final de 1998, Drummond recusou uma proposta para fazer "Escolinha do Barulho" na Record... Até porque, mesmo com uma oferta salarial maior que a da Globo, preferiu não abrir mão do contrato de longa duração com a emissora, além de ter se comprometido com Chico Anysio a comparecer no "Zorra Total"... Onde a "Escolinha" foi retomada logo na estreia, em 1999, com fôlego para voltar às tardes por um ano, em 2001... Porém a paixão recolhida de Maria Angélica pelo Seu Peru não foi suficiente para a nova fase do programa ir além do primeiro ano... Drummond continuou no "Zorra", participando de diversos quadros, principalmente como Seu Peru - não raro abrilhantando quadros nem tão geniais, como o do aeroporto, o Metrô Zorra Brasil ou o da Tetê PM, Mariana Santos - e também fazendo o indígena Taco, "pezinho pra frente, pezinho pra trás" , morrendo de medo de pegar resfriado numa gravação com André Damasceno, e o Vamperu, voltando a contracenar com Chico Anysio, que fazia Bento Carneiro, o Vampiro Brasileiro... Também chegou a fazer, em alguns programas de 2004, um analista canino que tinha cara de cachorro e falava como o Scooby-Doo... Em 2009, com 90 anos, pediu para diminuir o ritmo de trabalho no "Zorra Total", pois embora ainda conseguisse decorar textos, tinha medo de esquecer tudo em cena... Isso porque só parou de dirigir aos 95 anos, por insistência da família... Seu Peru, no entanto, não foi esquecido e ele se tornou uma das principais atrações da nova versão da Escolinha, em 2015, agora interpretado por Marcos Caruso... Que acreditou ter encontrado o tom de interpretação próximo ao de Orlando quando conseguiu fazer "bigode chinês" para falar... Em 21 de junho de 2019, Cininha de Paula fez uma homenagem a Drummond numa gravação da quinta temporada da nova "Escolinha", colocando lado a lado as duas versões do Seu Peru... O programa foi exibido pela Globo, depois de ter passado no canal Viva... Que se tornou o principal veículo dos trabalhos de Drummond... Que em meados da década de 1990, lembra Gagliardo, compareceria na programação global de manhã (desenhos...), de tarde (“Escolinha”...) e à noite (filmes...)... Isso se deve principalmente à exibição de três episódios da “Escolinha” diariamente – e desde sua estreia no canal da Globosat, em 4 de outubro de 2010, a atração é um dos campeões de audiência entre os humorísticos do canal... Também pode ser visto no “Zorra Total” e em participações especiais no “Toma Lá Dá Cá” e no “Papo Irado” – quadro em que Heloísa Perissé faz a Tati e que costuma servir de tapa buraco na programação... No dia do centenário, em 18 de outubro do ano passado, por exemplo, Seu Peru compareceu em dois programas da “Escolinha”... No primeiro, de 1993, disse ao professor Raimundo, à instância de Seu Gaudêncio, que sonega quando o bofe é um lixo e levou Joaquim Silvério dos Reis, o traidor dos inconfidentes em Minas, para a irmandade... No segundo, de 1992, mostrou para o professor a prótese de silicone que foi parar em suas costas... Tudo isso com a “hashtag” “Escolinha no Viva 100 Anos de Orlando Drummond”... , No dia seguinte, o canal Viva programou a exibição de “Bonga, O Vagabundo” para comemorar o aniversário de 100 anos de Orlando... Papel pequeno, o de garçom "sóbrio" em uma festa... Um tanto quanto atípico para quem sempre trabalhou forte com a voz, mas, enfim...
Em 1992, Drummond teve a chance, no programa dos Trapalhões, de encarnar uma de suas dublagens mais famosas, a de Popeye... |
EXTRAORDINÁRIO E CENTENÁRIO, ORLANDO DRUMMOND!!! SAÚDE, AMOR E PAZ - MEUS DESEJOS PRA ELE!!!
ResponderExcluir