sexta-feira, 7 de julho de 2017

A Saga do "Seu Souza" Segundo Suas Próprias Palavras...

Capa do livro tem assinatura inconfundível do "Seu Souza", cercado de coelhos azuis e Mônica de "papagaio de pirata"...






























































Aos 81 anos de idade, 58 deles dedicados à carreira de quadrinhista - a primeira tira do Bidu e do Franjinha foi publicada em 18 de julho de 1959, na antiga “Folha da Tarde” – Maurício de Souza, o “Seu Souza”, lançou sua autobiografia... Na verdade, o livro da Primeira Pessoa, selo da Editora Sextante, é um depoimento em primeira pessoa, concedido a Luís Colombini... Apesar do subtítulo “A História Que Não Está no Gibi”, Maurício já ensaiou contar a história de sua vida nas crônicas que escrevia para o jornal “Diário de Mogi”, a convite do próprio dono da publicação, Tirreno Da San Biagio, também conhecido como “Tote”, a partir de 1996... Ainda hoje, o jornal de Mogi das Cruzes, na região da Grande São Paulo, onde Maurício viveu na infância, adolescência e no começo da vida adulta, publica as tirinhas de seus personagens...  Inclusive “Os Souza”, que ele classifica como “tentativa malsucedida” de fazer um trabalho dentro da “fatia comportamental” da “pizza” dos tipos de história que em seu entender são apreciadas pelo público... Alis, o livro sequer menciona o Nico Demo, que também tinha humor mais “adúltero”...  As tiras são outra tradição de uma cidade que mantém alguns vestígios do passado, tais como as porteiras que isolam o tráfego de veículos e pedestres para o trem passar...  Os textos, também publicados na internet – alguns deles reunidos nos dois volumes de “Navegando nas Letras”, lançados pela Editora Globo em 1999 e 2000, trazem alguns episódios que são retomados no livro, como o trabalho em conjunto com a empresa japonesa Sanrio, que publicava as histórias do dinossauro Horácio no Japão em 1975 – a propósito, Maurício, está cada vez mais parecido fisicamente com o único personagem do qual ainda é responsável pelos roteiros e desenhos, atarracado, cabeça grande e braços curtos – ou a parceria que não vingou com a atriz Kim Basinger no início dos anos 1990... Outros acontecimentos relatados nas crônicas ganharam um novo enfoque, como a tentativa frustrada de colocar as revistas da Turma da Mônica no mercado europeu, em 1985 – deixando de lado a teoria sobre a concorrência dos títulos baseados em animes e tokusatsus japoneses, que formulou em suas crônicas, Maurício dá nome aos bois  e menciona as suspeitas de pressões da Disney, o que o deixa até um pouco lisonjeado -  ou os planos de montar um parque temático em São Paulo... Em “Navegando nas Letras”, o desenhista relata as gestões feitas  durante as gestões de Jânio Quadros e Luiza Erundina para adquirir o Anhembi...  Na autobiografia, surge o interesse em uma área na região do Parque Villa-Lobos e o contato com a administração Mário Covas e com aquele que chama de “seu secretário de Turismo”, João Dória Júnior – hoje prefeito da capital paulista, que tem como uma das metas de sua administração vender o Anhembi, entre outras propriedades da Prefeitura...  E desaparece o comentário feito em uma reunião com assessores de Jânio, de que ele teria de presentear com “flores e bombons”  alguns funcionários municipais de modo a assegurar a vitória na licitação do Anhembi...  O sonho se realizaria apenas em 1992, com o hoje saudoso Parque da Mônica na região do Shopping Eldorado, que pertencia e era administrado por um empresário, com Maurício recebendo uma parte da renda de bilheteria... O desenhista não queria repetir o insucesso da Vasconcelândia, na região de Guarulhos, José Vasconcellos, porém mesmo assim teria sérios problemas financeiros com o parque, como será relatado mais adiante...
































Cidade onde "Seu Souza" cresceu e começou a desenhar, Mogi das Cruzes ainda tem porteira na linha do trem...






























































O ponto alto do livro é a descrição de dois episódios espinhosos da vida de Maurício... O engajamento na Associação dos Desenhistas de São Paulo (Adesp), da qual foi presidente,  e na causa do incremento da publicação de histórias em quadrinhos nacionais, que o levou a ser mandado embora do grupo Folha - no qual foi revisor e repórter policial e se tornou ilustrador - e depois proscrito da imprensa paulistana em 1961... Fato já relatado no livro “A Guerra dos Gibis”, de Gonçalo Júnior, mas que na ocasião Maurício não havia contado em primeira pessoa... Convencido a participar da Adesp por três colegas desenhistas, Maurício presidia a entidade quando, acusado de ser comunista, entrou para o que denomina de "lista negra"...  Com dificuldades financeiras, foi sondado para ingressar na cooperativa  de desenhistas sustentada pelo governador Leonel Brizola, no Rio Grande do Sul... Recusou a oferta, ao saber que teria de fazer “algumas adaptações nos personagens”, a fim de “que eles também lutem pela causa”, o que em seu entender faria com que “eles se tornassem defensores do proletariado”... Para o desenhista, a “campanha para dar mais espaço aos desenhistas brasileiros” tinha se transformado “um instrumento político da luta de classes”... Decidido que “jamais colocaria ideologia” em suas histórias, nem ameaças o fizeram mudar dei ideia... A outra novidade é a história da crise financeira da Maurício de Souza Produções que quase levou ao seu fechamento na virada do século, devido a um contrato com a Globo assinado em dezembro de 1998... Resultado de uma das muitas demonstrações de megalomania de Marluce Dias da Silva, então diretora-geral da emissora... Esta não funcionou, por diversos fatores, já o BBB... No início daquele ano, Marluce prometeu a Maurício a produção de desenhos animados, de um programa diário inspirado em “Vila Sésamo” e “Sítio do Pica-Pau Amarelo”, um canal a cabo exclusivo, parques temáticos espalhados pelo Brasil, venda de desenhos e programas para o exterior, participação em contratos publicitários e de licenciamento... Maurício aceitou, pelos valores oferecidos e tendo em mente que o dono da Globo, Roberto Marinho fazia parte de sua vida, por meio dos quadrinhos que publicava – entre eles o “Gibi”, que virou sinônimo de revista de HQs – onde aprendeu a ler e tomou gosto pelo desenho... A emissora ofereceu um adiantamento vultoso, porém queria ter acesso a administração do Parque da Mônica, instalado no Shopping Eldorado, em São Paulo, para poder treinar seu pessoal na operação de parques temáticos, antes mesmo da assinatura do contrato... O parque não pertencia a Maurício, que se viu obrigado a comprá-lo do empresário que era proprietário por 10 milhões de dólares, quantia que deveria pagar em prestações mensais por sete anos, em julho de 1998... “A Globo, no entanto, não escalou ninguém para aprender os meandros da administração”... O acordo foi assinado e Maurício investiu mais 15 milhões de dólares em um estúdio de animação para produzir os desenhos que deveriam estrear na Globo em março de 1999... O programa deveria estrear três meses depois... Entretanto, apenas alguns desenhos seriam exibidos em junho, no “Angel Mix”... Maurício teve praticamente que “invadir” o galpão alugado pela Globo onde foram montados os cenários do programa – o bairro da turma da Mônica e o cemitério do Penadinho... O Parque da Mônica do Rio de Janeiro seria inaugurado sem que ninguém da Globo tivesse ido acompanhar a operação... No final de 1999, sem perspectivas de estreia, Marluce convenceu o desenhista a não romper o contrato e ainda pediu para que treinasse alguns roteiristas da Globo na produção de roteiros de animações... Tarefa que consumiu boa parte do ano seguinte, sem resultados efetivos, assim como a confecção de bonecos para o programa da Mônica...  Em 2001, depois de uma reunião com João Roberto Marinho, Maurício enviou uma carta anunciando que sairia do negócio... Enquanto demitia os funcionários do estúdio de animação, a Globo entrou com um processo exigindo indenização, ao qual respondeu com um pedido idêntico... “Brigar com a Globo é um dos piores negócios do mundo... O departamento jurídico da emissora  é um exército muito bem preparado... Juntando TV, jornal e rádio, o poder de fogo da empresa é gigantesco, tão grande que até o silêncio é ameaçador... Nos meses em que brigamos na justiça, fui banido da emissora... Não podia ser filmado, entrevistado, fotografado... Nenhuma linha em jornal, nenhuma aparição em TV”... Sagaz... Somente com a ascensão de Octávio Florisbal à direção-geral da Globo, em 2002, aconteceu um acordo e os processos foram retirados...  Maurício até conseguiu exibir os desenhos na Globo em 2003, acordo que durou um ano, sem ser renovado... Restou a dívida da aquisição do Parque da Mónica, que triplicou entre 2001 e 2003, levando a atrasos de pagamentos de salários e impostos... Apesar de ter conseguido equilibrar as finanças em 2004, o desenhista pediu para renegociar o débito no início do ano seguinte... Seria o início de uma batalha judicial com o credor, que chegou obter o bloqueio do dinheiro dos contratos de licenciamento para garantir o pagamento... A renegociação chegou ao fim em outubro de 2005, a dívida teve de ser paga novamente, desde a primeira parcela, o que Mauricio faz até hoje... O Parque da Mônica do Eldorado fechou em fevereiro de 2010 - o do Rio funcionou entre 2000 e 200, na região do shopping Cittá América - e em 2015, um novo parque foi aberto no SP Market, em parceria com a administradora do shopping, no lugar onde funcionaram o Parque do Gugu e O Mundo da Xuxa - a mesma que, a pedido do Edson (OG), ajudou no começo da carreira na Globo, chegando até a manter uma empresa de licenciamento conjunta...































Jornal da cidade, "Diário de Mogi", publica as tiras do desenhista, até as que não emplacaram, como é o caso de "Os Souza"...






























































A fase nebulosa seria superada devido a uma série de acontecimentos nos anos seguintes... Em 2004, os desenhos da Turma da Mônica começaram a ser exibidos no Cartoon Network, ganhando do Pancada o apelido de "Dona Candinha", devido ao desenho "Brincando de Boneca", estrelado pela Magali e pelo Cascão...  Em 2007, as revistas de histórias em quadrinhos, deixaram de ser publicadas pela Editora Globo, onde estavam desde 1987 - o que incluí o período do contrato desastroso com o braço televisivo das Organizações Globo – e passaram para a Panini... Uma ruptura sem traumas, ainda que a Globo tenha inundado o mercado com todo o estoque de revistas encalhadas depois da mudança de editora...  Em 2008, houve o lançamento da revista Turma da Mônica Jovem... Que além de resolver o problema  do leitor que crescia e se desinteressava pela turminha, começou a atrair o público infantil mais do que as histórias tradicionais...  O traço em estilo mangá da TMJ também abriu caminho para as “graphic novels” que levaram o traço dos personagens para além do padrão das duas cabeças e meia e cores chapadas com que Maurício superou os personagens de bochechas pontudas que surgiam de traços apressados, forçando-o ainda a desenhá-los sem sapatos, exceto o Cebolinha, e deram aos roteiros um tom mais reflexivo, que era buscado pelo desenhista em suas primeiras tiras... Uma inspiração confessa em “Peanuts”, Charlie Brown... Só faltou dar razão à lenda urbana e dizer que a Mônica é uma releitura da Luluzinha... Ops!!!... Mauricio aponta em sua autobiografia três portas de entrada para seus quadrinhos no início de sua trajetória... A “Folhinha”, suplemento infantil  da Folha de S.Paulo, lançada em 8 de setembro de 1963, e que marcou seu retorno ao jornal, já sob o comando de Otávio Flores de Oliveira... As publicações institucionais, de distribuição gratuita, um trabalho forte que teve início com a série de tiras sobre a campanha contra a desidratação infantil, realizada  pela secretaria municipal de Saúde de São Paulo, em 1965... E os comerciais da CICA, ideia do publicitário Ênio Mainardi – pai de Diogo Mainardi, aquele amante do desenho animado – na agência Proeme em 1969, a começar pelo Extrato de Tomate Elefante... Nos tempos da internet, o grande chamariz do público que está fora do “target” dos quadrinhos da Turma da Mônica é o Tumbrl “Pô, Maurício!!!”, cujo slogan é “Fora do contexto, ninguém é normal”...  A página criada por Fernando Marés de Souza apresenta trechos de histórias que dão margem a interpretações sarcásticas ou maliciosas – vide cenas de personagens sem roupa – acompanhadas de legendas que destacam a ironia ou a originalidade das citações, sempre acompanhadas de uma bronca... “Pô, Maurício!!!”...  Os personagens da turminha ganharam uma personalidade bem distinta das historinhas originais, além de serem rebatizados como “Mônico”, “Cebabaca”, “Magali Junkie”,  “Jeguemias”, internauta Pedro Henrique... Sem contar o “Espera o Hiro” do Chico Bento... Valeria a pena lançar uma seleção das melhores postagens em livro, basta o Paulo Peixoto, que faz a escolha do material que é postado junto com Rafael Monteiro e Renan Sampaio, entrar em acordo com o “Seu Souza”... Seria um “best-seller”, capaz de causar filas quilométricas para autógrafos na Bienal do Livro... Sendo que Maurício, ao lado de Ziraldo (ele chegou a desenhar algumas tiras do Pererê no início da década de 1960, a pedido do próprio Ziraldo, nunca publicadas...), é um dos reis da Bienal...  Onde demonstra uma incrível resistência para comparecer em todos os dias do evento, em diversos estandes, já que historicamente nunca concentrou a produção de livros numa única editora, em memoráveis sessões de autógrafos comandadas por seu “manager”, Sid Gus... O mesmo que fazia os jornaizinhos do Parque da Mônica... Vide foto da Bienal de 2014, publicada no livro, em que Maurício posa sorridente e dando “like” do Facebook © com as duas mãos, ao lado de atores vestidos de Chico Bento e Rosinha – que sempre faz um sucesso danado nesse evento... Na multidão atrás do desenhista e dos personagens, ao lado de uma fã sorridente de celular na mão, esta Sid, com o olhar e a expressão de uma autêntica eminência parda, digo... Na mesma linha do "Pô, Maurício", existe no Facebook (C) o grupo "Mônicas Deformadas em Muros de Escolinha", que reúne versões genéricas dos personagens da turminha... Não, internauta Chico Melancia... Aquela Mônica baby do "Vamos se Alimentar!!!" ficava na fachada de um restaurante na região do Itaim Paulista...















































Thmbrl "Pô, Maurício!!!" trouxe uma releitura para os internautas da trajetória e das criações do "Seu Souza"...

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