quarta-feira, 13 de abril de 2016

En "Nación TV", Chespirito é o vilão da novela da Televisa...

Nos capítulos anteriores, o apresentador do noticiário "24 Horas", alinhadíssimo com o governo, anuncia Chespirito...
































































































O livro "Nación TV - La Novela de Televisa", de Fabrizio Mejía Madrid, é um relato romanceado e crítico da história política da principal rede de televisão do México... Centrada na trajetória de três gerações de dirigentes da empresa... O pai, Emílio Azcarraga Vidarrueta, fundador da XEW em 1950, emissora que originaria o Tele Sistema Mexicano... O filho, Emílio Azcarraga Milmo, "El Tigre", que criou a Televisa em 1973, a partir da fusão da XEW com a Television Independiente de México... O neto, Emilio Azcarraga Jean, atual comandante do grupo de mídia... Chamar a história da Televisa de "novela", apesar da teledramaturgia ser uma das especialidades da casa, está muito longe de ser um elogio... Ao contrário, ao comentar sobre as novelas da emissora, o autor não poupa críticas... "O que memorizei foi a sensação enclausurada de todas as novelas... Diálogos intermináveis em sofás, escritórios, restaurantes"... Quase a mesma impressão deixada pela última edição do BBB, digo... "A ideia de trama na Televisa sempre expressou melhor como ela mesma atuava em política...  O segredo, a intriga, o favor, a chantagem"... Quase uma Globo manipuladora, vendendo seu principal "reality-show" como metáfora da mudança no poder que alguns grupos querem impor à força ao país... Ops!!!... Além dos protagonistas, a trama do livro tem como personagens vários presidentes do México - como Carlos Salinas de Grotari, eleito de forma fraudulenta em 1988, mas que ao privatizar a televisão estatal em 1993, permitiu o surgimento da maior concorrente da emissora, a TV Azteca - e figuras importantes da programação da Televisa, como o jornalista Jacobo Zabludovsky ("24 Horas"), os apresentadores Paco Stanley e Raul Velasco ("Siempre en Domingo"), a cantora Gloria Trevi, a atriz Lucero - consagrada como "Chispita" a mesma que o SBT acaba de contratar para a versão brasileira de "Carinha de Anjo"  - os comediantes Humberto Navarro - "Pajara Peggy", de "La Carabina de Ambrosio" - e Roberto Gómez Bolaños... Chespirito tem participação destacada em dois momentos da história... Na década de 1940, quando sua gangue juvenil na região da Colonia Del Valle - Los Aracuanes, em que pontificavam seu irmão Horácio e Ramiro Orci, que faria participações esporádicas em suas séries - era precisa fácil de seus rivais - Los Halcones, da região da Colonia Roma, da qual faziam parte os futuros presidentes Luiz Echeverria, José Lopez Portillo e Arturo "El Negro" Durazo Moreno, membro da milícia que cuidou da repressão aos protestos estudantis de 1968 e chefe de polícia da Cidade do México entre 1976 e 1982, posto do qual foi afastado por corrupção ... Cinco décadas depois, já consagrado mas afastado da televisão, Bolaños é um dos alvos do processo de renovação que Emílio Azcarraga Jean inicia na Televisa após a morte do pai, em 1997... Ainda assim, o herdeiro compareceu pessoalmente a três grandes homenagens feitas para Chespirito na emissora, em 2000, 2005 e 2012... Também vale lembrar que, a despeito das ligações da Televisa com o Partido Revolucionário Institucional, que domina a política mexicana há quase um século, muito ressaltadas no livro, após a ascensão de Azcarraga Jean ao comando da Televisa, Bolaños se engajou na campanha dos candidatos Vicente Fox e Felipe Calderón, do PAN, que venceram as eleições presidenciais em 2000 e 2006... Em 2012, com Enrique Pena Nieto, o poder voltou ao PRI... Emilio Azcarraga Jean, por sua vez, continuava com seu ímpeto modernizador na Televisa, tirando o programa de Javier Lopez, o popular Chabelo, após 47 anos de exibição...  Ah, sim... Temos um aviso a fazer... Os trechos a seguir não são recomendados para os admiradores da obra de Roberto Goméz Bolaños, mesmo que o autor tenha preferido não mencionar "as relações de Chespirito com os narcotraficantes colombianos"...

"Para Emílio, Chespirito era uma anedota da televisão, um desses personagens fugazes a que Emílio podia homenagear quando completam 80 anos... Emilio via seus programas de supostos chistes na casa da mãe, Nadine: cacetadas... Isso é o que recorda... E deixou ele cair também... Os condenados já o são antes do julgamento... E agora a sentença era exclusivamente sua... Como qualificá-lo na televisão do século XXI???... Por sua história... Porém, sua história era, agora, uma caricatura... Nada podia se fazer contra isso... O país todo era um exagero de si mesmo, algo risível, uma aberração"...
































































































Que fala do Chile - mas não de Pinochet - tendo a seu lado Eduardo Manzano, que não perguntou do Besouro Verde...
































































































"Em 1977, quase dez anos depois do nascimento de Emílio em 1968, o romance de Chespirito com Florinda Meza, que interpretava os papeis femininos em suas duas séries de televisão, começou em meio a uma visita ao ditador Augusto Pinochet em Santiago do Chile... Florinda tinha sido namorada de outro integrante do elenco de 'Chaves', Carlos Villagrán, Quico, mas por um REGAÑO do chefe Goméz Bolaños-Cacho, haviam-se separado...

- Não podemos ser como todos na Televisa, que aproveitam os programas para encostar-se um com os outros - lhes disse...

Dois anos depois Goméz Bolaños entrada de braços dados com Florinda a saudar Pinochet (...) Agora caminhavam por um tapete vermelho, ele vestido de fraque e ela com vestido longo e um diadema de lápis-lazuli, que disseram a ela ser originário do Chile... De uma cadeira branca com detalhes em dourado, Pinochet se levantou para saudá-los... Os atores levaram a mão à testa, como fazem os militares, e depois fizeram uma reverência... Pinochet se apeteceu com essa confusão em ser considerado um militar, e a um só tempo, um monarca...

- Gostamos muito de seus programas, senhor Roberto - disse Pinochet a Goméz Bolaños - O humor nada tem a ver com a política, com as leviandades e nem com a vulgaridade... O senhor é o melhor exemplo disto...
- Muito obrigado, meu general - respondeu Goméz Bolaños quando lhe foi permitido - isso é algo que fiz 'sem querer, querendo'...


O riso dos militares inundou o Palácio La Moneda (...) A história pessoal de Gómez Bolaños estava neste momento saldada...  Sobrinho de um dos grandes repressores mexicanos. Gustavo Diaz Ordaz, Goméz Bolaños havia saído de uma agência de publicidade, Noble D'Arcy - 'Chevrolet, rende mais e jamais se rende', havia celebrado o slogan seu chefe, Mario De La Piedra - para ser roteirista de uns programas estranhos, onde os personagens repetiam diálogos que, na verdade, eram motes publicitários... 'Foi sem querer querendo'... 'Não contavam com minha astúcia'... 'Palma, palma, não priemos cânico'... A publicidade como celebridade, frases que as pessoas aprendem sem saber porquê... Os chistes de Goméz Bolaños vinham de golpes entre personagens a que se seguiam uma risada gravada para indicar ao público quando deviam tomar algo como engraçado...  O general Augusto Pinochet gostava da comédia 'controlada' e buscava naquele outubro de 1977 que cada gesto, expressão e atitude dos chilenos estivesse regulada pelo medo da polícia, do exército e da 'secreta'... No caso de Chespirito, a ordem de rir era antecedida pelas risadas gravadas... Tudo estava controlado... Se Chespirito via a si mesmo como um mimo de autocensura - sua regra era: 'nem grosserias, nem sexo, nem política' - no ano em que 'El Tigre' Azcarraga morreu, se enxergava cada vez mais como um escritor... O herdeiro, Emílio Azcarraga Jean, o via como uma piada ruim de sua infância...
































































































Suas histórias fazem rir seu patrão Emilio "El Tigre" Azcarraga Milmo - e o presidente José Lopez Portillo também...
































































































"Quando em 1980 Chespirito visitou a Colômbia, o então presidente Julio César Turbay lhe concedeu cidadania colombiana 'automática'. Era o mesmo presidente que havia acusado o escritor Gabriel Garcia Marquez de ser integrante da guerrilha conhecida como M-19 e, com isso, levando-o a se exilar no México...  Este sucesso pareceu a Chespirito que Turbay o considerava  ainda mais importante do que Garcia Marquez, e começou a se vagloriar de que também escrevia, poemas, canções, peças de teatro... Ele não podia ver, no entanto os outros levantaram um pouco as sobrancelhas quando começou a dar entrevistas em que tratava de citar a Einstein, Churchill ou a Cervantes sem bons resultados... As antologias de aforismos de 'Seleções do Readers Digest' não serviam para suprir a cultura, que é o que resta quando tudo é esquecido ... Porém Chespirito, igual ao general Durazo, acreditava  que memorizar citações compensava a falta de educação e leitura... Ao final, o rancor transparecia no que dizia Roberto Goméz Bolaños...


- Se alguém me dá inveja é Juan Rulfo, que escreveu dois livros de fama internacional... Eu tenho 250 volumes encadernados com meus roteiros...Perguntem quantos prêmios me deram... Nenhum... Nem de obra, nem de atuação, nem de direção, nem de tempo... De nada... Um dia, como disse o padre jesuíta Teilhard de Chardín - ele pronuncia como se lê em espanhol -se uniram o 'acima' e o 'adiante', quer dizer, Deus e o progresso...Espero que me toque (...)



Mas a ideia de sentir-se um intelectual havia ocorrido a Chespirito na visita a Augusto Pinochet, no Chile... Ali decidiu, também, que a ele não podiam aplicar-se as regras e o que era bom para um ator de seu elenco sem 'desenvolvimento intelectual', Carlos Villagrán, não era para ele, a que era recebido por milhões de latino-americanos, fascinados 'por um tipo de comédia baseado em 'O Gordo e o Magro", porém com 'o sentimento de Charles Chaplin'... E entrou de braços dados com sua atriz, Florinda Meza, a saudar o ditador dos chilenos...  O resto do mundo televisivo havia entrado na era de Lenny Bruce, de Monty Phyton, de Woody Allen, porém a 'comédia' da Televisa buscava todavia restringir-se ao que o cinema mudo havia esgotado... As cacetadas, as tortadas, os encontrões... Mais que um escritor, Bolaños era uma anomalia histórica e a América Latina dos ditadores parecia compartilhá-la (...) Para ele, os 30 milhões que El Tigre Azcarraga lhe contabilizou como audiência significavam um futuro de homenagens, prêmios literários, medalhas... E como não vinham de pronto, se amargurava... Desaforado com os reconhecimentos que não lhe eram logrados, Chespirito rompeu o bloqueio que o México mantinha com a ditadura de Pinochet e se apresentou em duas funções no Estádio Nacional de Santiago (...) Mas Gómez Bolaños, sempre ressentido pela falta de reconhecimento no mundo literário e cinematográfico, se sentia chamado a publicar 'poesia', autobiografias onde ocultava quase tudo e a dar sua opinião (...) Não se dava conta de que as pessoas o viam como Chespirito, uma colcha de retalhos de quedas e cacetadas próprias do cinema mudo... Não queriam escutar ele (...) Não era nada mais que seus dois personagens (...) Apesar de que milhões o viam absortos em toda América Latina por obra das transmissões via satélite, ninguém o escutava... Ninguém o levava a sério... Havia sucedido a ele o mesmo que a própria Televisa... Tinha morrido em algum momento dos anos 1980 sem que tivesse notado...  Ele, que havia tratado de que seus slogans publicitários fossem tomados como chistes, terminou desaparecido, ao fim, no que jamais pode transcender... O silêncio"...































Apesar do célebre desfile em Bogotá, colombianos dizem... "Dormiu Shakespeare, acordou Chespirito"...

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