Biografia revela que Maurício Sherman colocou câmera exclusiva para acompanhar cacos de Renato Aragão como Didi... |
No primeiro dia do ano, o canal Viva finalmente começou a mostrar “Os Trapalhões”... O programa mostrado, de 1988, é o mesmo que passou na Globo Portugal e, por meio do streaming, chegou ao conhecimento dos internautas brasileiros, vide postagem do seu Bloquinho Virtual no último dia 8 de novembro... A exibição foi exatamente a mesma, exceto por algumas partes cortadas... Os anúncios dos sorteios da Yakult ® e Sulfabril ® no penúltimo bloco e, logo no início, o quadro da luta de boxe entre Kid Boy Xexéu e Didi Mocó Sonrisepi Colesterol Novalgino Mufumbo... A mudança acabou agradando em cheio os fãs mais saudosistas, pois o programa começou com o musical de “Terezinha”, canção de Chico Buarque interpretada por Maria Bethânia... Apesar das muitas reprises no “Vídio Xô”, um dos momentos mais lembrados de “Os Trapalhões”... Renato Aragão ouviu a música pela primeira vez no rádio de seu carro, no Rio de Janeiro... No exato instante em que bateu a inspiração de leva-la ao programa, Renato parou o carro para anotar a ideia... O hábito de carregar um caderninho de anotações, que o comediante mantém desde o começo da carreira artística, em 1960, é relatado no capítulo “Ideia boa é no papel” da biografia “Renato Aragão, do Ceará para o Coração do Brasil”, escrito por Rodrigo Fonseca e lançado pela Estação Brasil... O programa de estreia no Viva, apesar de ter quadros gravados em anos anteriores – sendo a abertura a mesma de 1984, em que o autor destaca o uso da técnica de rotoscopia para transformar os Trapalhões em personagens de desenhos animados por Hans Donner e a dificuldade de Renato gravar um chute de bicicleta, vestido de presidiário, em uma bola de ferro presa a seu tornozelo por uma corrente - já contava com a direção geral de Wilton Franco... Que em 1966 teve de criar um programa que servisse de veículo para o cantor Wanderley Cardoso para a TV Excelsior e pudesse concorrer em pé de igualdade com “Jovem Guarda”, comandado por Roberto Carlos na TV Record... O livro de Fonseca, citando outra obra sobre o comediante, relata que o diretor considerou um programa de uma hora muito grande para um único apresentador, ou uma dupla deles... Conversando com Renato, decidiu montar um programa de humor com um quarteto, “cada qual com um perfil diferente”... Assim, para contracenar com o comediante e o cantor, foram chamados o lutador Ted Boy Marino – que aparece no esquete da luta de boxe, não mostrado pelo Viva – e o cantor Ivon Curi... A atração ganhou o nome de “Os Adoráveis Trapalhões”... No livro “Biografia da Televisão Brasileira”, Dedé Santana conta uma história um pouco diferente... Wilton Franco reuniu a primeira formação dos Trapalhões, no início, em um quadro do programa “A Cidade Se Diverte”... Dedé sabe porque esteve lá, pois já trabalhava forte na escada para o elenco principal da atração... E, como escreve Fonseca, tão logo conheceu Renato, deu um conselho... “Cara, desculpe falar, mas esse seu bigodinho aí está fora de moda”... Pintar o cabelo foi uma dica de Chico Anysio – “Humorista de cabelo branco é muito triste” – vide entrevista ao “Pasquim” em 1978... A importância de Wilton Franco na trajetória de Renato Aragão é inegável – faltou o autor lembrar que ele era a mais famosa “voz da consciência” de Aparício, personagem que chama de “espécie de cota marxista na fauna de tipos de Renato” - entretanto as páginas do livro atestam a genialidade de outro diretor de televisão que trabalhou com ele – Maurício Sherman... É dele a ideia de colocar uma das câmeras que filmavam os quadros do programa focada exclusivamente em Didi... Para não perder de vista os “cacos” que colocava nos textos, muitas vezes comentários irônicos sobre o figurino ou os cenários... Como no quadro exibido na estreia do Viva, no qual os Trapalhões recebem Zecão, um primo de Mussum que foi para os Estados Unidos e se transformou em Vera Verão, empresária do Michael Jackson – de Pirituba... Didi compara o primo de Mussum, que comparece vestindo uma capa de oncinha, a He-Man... Balança o pé para não aceitar a proposta de usar um traje parecido para apresentar o artista... Puxa o tapete da sala para ele se apresentar... Ao descobrir que se trata de um embuste, chama Zecão, digo, Vera Verão, de “Maria Capeta”... Sendo que Daniel Filho valeu-se do mesmo recurso quando dirigiu o filme “O Cangaceiro Trapalhão”, de 1983 - o livro tem um encarte colorido com cartazes dos filmes de Renato Aragão e dos Trapalhões, inclusive um desprezado pelo próprio, “Dois na Lona”, de 1968... Também é de Sherman a ideia de Renato interpretar o anão Ananias, que apareceu no programa em 1990 ... Inspirada em um programa estadunidense, mas que ganhou um toque legitimamente brasileiro nas mãos do diretor e do cômico... Indiretamente, também contribuiu para a criação de outro tipo de Renato, a Severina Passo Raso... Baseada na Salomé de Passo Fundo, personagem que Sherman sugeriu a Chico Anysio, e nos últimos anos da ditadura militar brasileira, falava ao telefone com seu antigo aluno na escola primária, o presidente João Baptista de Oliveira Figueiredo... “A fim de satirizar o jeitão dessa gaúcha, Renato resolveu criar uma empregada para Salomé, a faxineira Severina... Enquanto a patroa só conversava com o presidente, ela falava com quem aparecesse na linha, até político, com um jeitão escrachado... Foi um êxito popular instantâneo... Mas o maior sucesso dela se deu em Portugal”... Então é por isso que Alberto Roberto só queria trabalhar com “Maurício Sherma”, Pancada...
"Os Trapalhões" no Viva começou com quadro preferido dos internautas, e do Vidio Xô, o musical de "Terezinha"... |
O roteirista e crítico de cinema Rodrigo Fonseca, fã declarado de Renato - e também de Silvester Stallone, vide histórias contadas pelo Edson (OG) sobre a fratura na mão que o ator estadunidense sofreu quando atuou como goleiro no filme “Fuga Para A Vitória” - descreve no livro “Os Adoráveis Trapalhões” e outros programas que contaram com o personagem Didi... Cujo nome surgiu de uma inspiração repentina quando Renato escrevia o primeiro esquete para a TV Ceará, em 1960... “Precisava de um pseudônimo simples e sonoro como era, por exemplo, Oscarito, e pintou essa ideia, do nada, como muitas de minhas invenções”... Nada a ver com o jogador de futebol Valdir Pereira, o Didi, internauta Pedro Henrique... O sobrenome surgiu ao vivo, já na TV Tupi carioca, no programa “AEIO... Urca”, no quadro do retirante que preenche uma ficha de emprego... Didi Mocó Sonrisepi Colesterol Novalgino Mufumbo... Depois da Excelsior, ele foi com Dedé para a Record, fazer “Os Insociáveis”... Apesar do nome imposto pela direção da emissora, foi nesse programa que Mussum, vindo diretamente do conjunto Os Originais do Samba, começou a trabalhar com Renato... E após uma gravação, na saída do estúdio da Record, ele conheceu aquela que viria a ser sua futura “sócia”, Lilian Taranto – na ocasião, apenas uma pequena fã com seis anos de idade... O nome “Os Trapalhões” volta a ser utilizado na TV Tupi de São Paulo, onde Zacarias completa o quarteto e o diretor argentino Tito Di Miglio exulta quando o humorístico supera o “Fantástico” no Ibope... “Gañamos da Globo!!!”... Os salários atrasados na Tupi – comemorados com um bolo de aniversário, que ajudou o advogado Renato Aragão a ganhar a causa na Justiça – e a aceitação de todas as exigências feitas a José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, então diretor-geral da Globo, levaram os quatro para a emissora carioca... Onde fizeram quadros como o do vendedor de ovos, também mostrado no primeiro programa do Viva... Com participação de Carlos Kurt, tema do capítulo “Fauna de Vilões”, no papel de macarrão de hospital... Quer dizer, do homem que vai namorar embaixo da janela de Didi e, ao ser alvejado por seus ovos, dá uma surra tão grande que foi preciso anunciar a venda de ovos mexidos... Apesar da opinião em contrário do Chico Sarney, os musicais eram um dos pontos altos do programa, vide Didi encarnando Tadeu a quem a cantora Clemilda pedia ao delegado para prender , interpretando o forró “Prenda o Tadeu”... Carlos Manga, que também dirigiu “Os Trapalhões e o Rei do Futebol”, de 1986 – que segundo o Mestre, deveria ser o representante da filmografia de Renato Aragão na lista das 100 maiores produções do cinema brasileiro de todos os tempos, substituindo a primeira versão de “Os Saltimbancos Trapalhões” – agregou gravações em externa ao programa, vide quadro em que Didi confere a voltagem e faz Mussum e Marcelo de Nóbrega trocarem de cor... Também permitiu em 1986 que Renato fizesse uma homenagem ao ídolo Oscarito – Fonseca escreve que eles se encontraram uma única vez, em 1966, nos bastidores de uma peça que Oscarito fazia com Dercy Gonçalves, “Cocó My Darling”, reunião intermediada pelo comediante Colé, tio de Dedé Santana – ao refazer com Grande Otelo a cena em que ele e Oscarito parodiaram “Romeu e Julieta” no filme “Carnaval no Fogo”, de 1949... Mais clássico, só Didi bancando o Barbeiro de Sevilha para cima de Roberto Guilherme, no penúltimo esquete do programa de estreia do Viva... “Os Trapalhões” prosseguiu depois da saída de cena de Zacarias, em 1990 e no final de 1993, depois de uma temporada com textos do Casseta e Planeta e direção de José Lavigne, Boni decidiu parar com o programa... Renato precisava descansar, acreditou... Mesmo assim, as reprises, que começaram em 1994 – ano do adeus de Mussum - e seguiram com interrupções até 2000, bombaram e foram para o Guinness... Marluce Dias, ao assumir a direção-geral da Globo, pensava diferente, e colocou ele para trabalhar forte em um novo programa... Depois do “Renato Aragão Especial”, veio “A Turma do Didi”, em 1998... Sem Dedé, que chegou a concorrer com ele nos tempos de “Dedé e o Comando Maluco”, no SBT... Quando voltou a trabalhar com Renato, em 2008, a pedra no sapato passou a ser a série “Smallville”... Uma reformulação foi tentada em 2010, quando estreou “Aventuras do Didi”, que fora da proposta inicial teve fôlego para seguir até 2013... Aí o desejo do novo diretor-geral Carlos Henrique Schroder mudar completamente o humor da Globo tirou Didi de vez do ar... Uma saída sem fanfarras, ao contrário da banda que saudava a “Campanha Nacional da Economia” com música de vitrola, no esquete que encerra a primeira exibição do Viva... Mas isso o livro não conta, não nesses termos, pelo menos...
No esquete do vendedor de ovos, Didi brigou com "macarrão de hospital", digo, seu vilão preferido, Carlos Kurt... |
O livro traz análises de especialistas sobre os filmes e traça um perfil do cinéfilo Renato Aragão... Fã de Quentin Tarantino, vide “Bastardos Inglórios” (2009) e “Django Livre” (2012), do ator Christoph Waltz e da atriz Diane Kruger, para quem Fonseca pediu um autógrafo em Cannes, depois presenteado a seu biografado, o comediante também admira Steven Spielberg, Charles Chaplin, Oscarito, Jerry Lewis e Carmem Miranda – vide visita a Hollywood ciceroneada pelo músico Zé Carioca, que inspirou o personagem de Valdisnei e criou a piada do “Me queimou, Zé”... Amigo de José Padilha, o diretor de “Tropa de Elite”, tem “...E O Vento Levou” (1939) e “A Noviça Rebelde” (1965) na conta de grandes clássicos do cinema, sem esquecer de produções recentes, como “Mulher Maravilha” (2017), vide Gal Gadot, internauta Chico Melancia... Alis, ao falar da nova versão do filme “Os Saltimbancos Trapalhões” (2017), o autor faz uma citação elogiosa à filha mais nova de Renato, Livian Aragão, a quem atribui “um jeitinho Meg Ryan de sorrir”... Ao menos Roberto Guilherme estava lá, digo... Também há ensaios sobre os programas de TV – uma delas, “O riso na TV”, de Paulo Senna menciona a inspiração vinda de Ronald Golias, que é pouco lembrada, mesmo que a reunião dos dois tenha sido cogitada quando aconteceu a separação dos Trapalhões, em 1983, vide biografia de Juliano Barreto sobre Mussum – e também aborda a produção televisiva posterior a “Os Trapalhões” de Renato Aragão... Sobre “A Turma do Didi”, que estreou em 1998, o autor mostra que o grande desafio da atração era a transição de público no começo das tardes de domingo... Ou como analisa Renato... “Aos domingos, a TV se divide entre o horário matinal dos esportes, majoritariamente masculino, e a troca para um perfil mais ‘família’, que aconteceu a partir do meio-dia, quando as pessoas estão mais ligadas na hora do almoço”... Então, como pontua o autor... “A isca era um quadro de erros das gravações, ‘Armações e Mancadas’, que pegava o público de surpresa, uma vez que nada estava combinado... Fazia, às vezes, mais sucesso do que as piadas”... Então é por isso que Pancada esperava o final do programa só para ver o que Renato Aragão iria aprontar com Roberto Guilherme e as reclamações do intérprete do Sargento Pincel para o diretor do programa, Guto Franco... Que entre uma bronca e outra no comediante, ganhou dele o apelido de “Vovó Donalda”... Na “Turma do Didi” que passou antes de “Os Trapalhões”, Renato simplesmente molhou as calças de Guto... Sobre a nova versão de humorístico, mostrada ano passado, cuja rejeição ao ser exibida na Globo também impulsionou a decisão do Viva de mostrar o programa clássico e finalmente cumprir uma promessa de mais de cinco anos (isso, a solução de alguns problemas de direitos para o remake e o acesso ao streaming da Globo Portugal...), o roteirista Péricles Barros faz uma revelação sobre a produção do programa... “Quando começamos, junto com a equipe de roteiristas, a escrever os roteiros, apenas o Didico (Lucas Veloso), estava escalado pelo Ricardo Waddington... Por isso, boa parte dos textos foi desenvolvida sem que os apresentadores soubessem quem são os novos atores... Se isso nos limitou, em parte, por outro lado também nos faz imaginar, para aquelas cenas, a única referência possível... Os Trapalhões originais... E isso nos possibilitou gravar cenas bem fieis ao tom de Didi, Dedé, Mussum e Zacarias”... Há controvérsias, Carlos Dias, digo... A exibição do Viva não teve maiores problemas, a ponto de Fonseca o considerar “um de seus maiores sucessos”... Mas quando estreou na Globo, mesmo com o comparecimento do Didi e Dedé originais, parece que o jogo virou, não é mesmo???... Tanto que a ideia de fazer novas temporadas, a exemplo do remake da “Escolinha do Professor Raimundo”, foi engavetada com a desmobilização da equipe de produção, Ricardo Waddington... Com pelo menos um programa não exibido... O penúltimo da temporada de dez episódios... Reservado para estrear na Globo e que deveria ser exibido em 12 de novembro, dia do Grande Prêmio do Brasil de Fórmula-1... Entretanto, ele foi substituído por um compacto com os melhores momentos dos programas anteriores... Segundo consta, o programa inédito conta com uma nova versão para o musical de “Terezinha”... O próprio Rodrigo Fonseca, no capítulo “Ananias, o Louco e Aparício” menciona que... “Na segunda temporada de ‘Os Trapalhões’, gravada nos Estúdios Globo em 2017, sob a direção de Fred Mayrink, um anãozinho folgado aprontava das suas, jogando o corpo de um lado para outro sempre que se via acuado ou queria mostrar destreza”... Como não há perspectiva de continuidade do programa – nem de mostrarem o episódio perdido - a resultado da releitura de Ananias ainda é desconhecido... O anão não está sozinho, pois também gravaram um quadro com um personagem baseado em fatos reais, não citado no livro... O Véio, cujo nome vem do apelido dado a Renato pelos outros Trapalhões... O Véio dançou!!! O Véio dançou!!!...
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