Atualmente, Aécio não vale nem menos da metade do preço da sua biografia na ponta de estoque... |
O Brasil está na situação em que se encontra porque Aécio Neves não aceitou a derrota na eleição presidencial de 2014... No livro “Quando a Política Vale a Pena”, ao comentar sobre a agonia prolongada de Tancredo Neves, seu avô, internado às vésperas de tomar posse na presidência da república, em 1985, o senador por Minas Gerais, atualmente afastado do cargo, disse... “Tudo o que se sucedeu a partir daquele momento ficaria impregnado na minha memória – e, estou certo, na lembrança de todo o país – como o enredo de uma narrativa inverossímil, se não de todo fictícia, primeiro com o atropelo urgente da primeira cirurgia, na vertigem das decisões apressadas, depois no desdobramento lento, atroz de uma agonia pessoal e também coletiva. Sempre digo que se um romancista ou um roteirista tivesse inventado tal história, ela seria um fracasso, não teria a menor credibilidade, tão inverossímil pareceria”... Pois bem... A conspiração iniciada quando Aécio perdeu nas urnas lembra o roteiro dos filmes sobre grandes roubos... Os assaltantes se juntam, planejam cuidadosamente toda a ação e realizam o roubo com sucesso, porém na hora de repartir o produto, acabam por destruir a si mesmos... Aécio teria ido contra a própria natureza, como afirmou no livro... “Tenho fama de ser conciliador e de não ser agressivo. Não sou de gritar, de estufar a veia do pescoço, de pular na jugular dos adversários. Não se muda a própria personalidade. O político pode até adequá-la ao sabor de certas circunstâncias – mas mudar a personalidade, jamais. Penso assim: você pode ser ameno no trato, compreensivo com as diferenças e extremamente firme e determinado em suas ações”... Depois de contestar os resultados eleitorais, Aécio juntou-se ao parlamentar Eduardo Cunha, que elegeu-se presidente da Câmara dos Deputados e usou as “pautas-bomba” no parlamento para travar as iniciativas do Executivo visando contornar a crise, ao vice-presidente Michel Temer, que sinalizou sua insubordinação à presidência com o documento “Uma ponte para o futuro”, e a outros nomes, como José Serra, Paulo Skaf e Romero Jucá, em uma conspiração contra Dilma Rousseff, que ganhou às ruas personificado em movimentos como o MBL e o Vem Pra Rua, numa continuidade do clima tenso da campanha eleitoral... “Aprendi a curtir a pele e blindar a alma para sobreviver no dia a dia e ao tipo de adversários que costumo enfrentar. Sei que uma campanha presidencial pode virar uma carnificina de mentiras e calúnias e uma sucessão de absurdos atentados morais amplificados pelo poder multiplicador da internet. O terrorismo espreita a cada blog, a cada post, a cada site. Nossos adversários, ao chegarem no poder, fizeram dele uma barricada para proteger sua própria incompetência. São, na maioria, profissionalmente desqualificados e temem voltar ao mercado de trabalho, disputar o emprego para o qual não estão preparados. A profissão deles é o aparelho do Estado. Por ela, estarão dispostos a tudo”... Usando os expedientes que atribuiu aos adversários, Aécio e os outros conspiradores impuseram ao país um impeachment com uma frágil base legal e destituído de legitimidade, e uma vez apossados do governo, começaram uma luta interna para monopolizar o poder, enquanto implantam reformas impopulares, mas que atendem os interesses dos grupos econômicos que deram suporte ao golpe parlamentar...
A boa vida de intercambista dos Estados Unidos acabou por imposição do avô, Tancredo Neves... |
No livro, Aécio faz questão de ressaltar suas raízes mineiras... “Mudamos para o Rio em 1970. Meu pai ia fazer um curso na Escola Superior de Guerra e fomos todos, minha mãe, minha irmã Andrea, eu e a mais nova, Angela. Não dá para esconder o fascínio que o Rio podia – e pode – despertar num garoto de 10 anos. Mas o Rio, para mim, foi além do Rio. Meu mundo se ampliou. Desgarrado das minhas raízes, pude entender o mosaico cultural, social e étnico que compunha a ex-capital federal (...) No Rio, pude exercer plenamente o justificável fascínio de ser jovem, pecado que às vezes me acusam ainda hoje (...) A praia, o futebol e os namoros me ocupavam, em ares de liberdade que foram afastando a política para longe, eco cada vez mais distantes das conversas em família” (...) “Passei minha adolescência de frente para o mar. A praia é um mestrado em democracia. A praia não discrimina, ele aproxima. Joguei vôlei e futebol na areia, convivi com Deus e o mundo (...) De minha parte, eu me sentia especialmente vocacionado para os embates da bola, porque era canhoto, assim como o eram Tostão, Gérson e Rivellino – integrantes daquela invencível seleção de 1970, com a qual me extasiei aos dez anos de idade”... Caberia ao avô de Aécio, Tancredo Neves, a decisão de trazer o neto de volta a Minas... “Foi num daqueles sagrados almoços domingueiros em família, no Rio, em dezembro de 1981, que ouvi de meu avô: ‘Pode se preparar para largar essa vida de surfista porque vou precisar de você – falou com o sorriso maroto que, no entanto, deixava entrever um propósito muito sério”... Aécio acompanhou Tancredo na campanha eleitoral de 1982, quando o avô venceu a disputa para o governo de Minas Gerais concorrendo pelo PMDB, e depois nas articulações pelas Diretas-Já e, quando a emenda Dante de Oliveira foi rejeitada pela Câmara dos Deputados, em 1984, da candidatura indireta de Tancredo à presidência e da formação do governo após a vitória no Colégio Eleitoral em janeiro de 1985... “O estilo dele era: ouvir muito, falar pouco, anotar – e decidir de acordo com sua própria convicção. A escolha do ministro da Fazenda – a quem caberia o melindroso papel de administrar uma economia em frangalhos – era um bom exemplo. O presidente eleito tinha grande apreço por Olavo Setubal, figura notável nas articulações empresariais e políticas em São Paulo, em torno da candidatura de Tancredo. Mas ele sabia, que, naquele momento, não poderia colocar um banqueiro na Fazenda. A escolha já estava feita: seria Francisco Dornelles. A intimidade entre tio e sobrinho faria de Tancredo um pouco ministro da Fazenda, ele próprio”... E pensar que hoje se discute a validade de indicar um “banker” – Henrique Meirelles – para disputar a presidência da república, caso Michel Temer deixe o cargo... Depois de Tancredo sair de cena, e José Sarney assumir a presidência – graças aos decretos de nomeação do ministério que o avô fez questão de assinar antes de ser internado no Hospital de Base de Brasília – Aécio foi diretor da Caixa Econômica Federal (da área de loterias, Juca K....) e elegeu-se deputado federal constituinte em 1986... Vitória eleitoral que o próprio Aécio admite ser uma decorrência do uso do sobrenome do avô materno – antes das eleições, assinava como o pai, Aécio Cunha, que já era deputado federal... O recurso aos nomes seria retomado nas eleições de 2010, quando Aécio foi na onda da popularidade do Luis Inácio e fez campanha utilizando as fórmulas “Dilmécio” – Dilma presidenta e Aécio senador – “Dilmasia” – Dilma presidência e Antonio Anastasia, candidato de Aécio a sua sucessão no cargo de governador de Minas – “Helécio” – Hélio Costa governador e Aécio senador, entre outras... Na Constituinte, em 1987, Aécio atuou na Subcomissão da Nacionalidade, da Soberania e das Relações Internacionais e fui o primeiro vice-presidente da Comissão dos Direitos e Garantias do Homem e da Mulher... “Era a chance que eu tinha de arejar o ranço patriarcal das antigas cartas. Apresentei, ao todo, 46 emendas... Uma deles, vitoriosa, também apresentada por outras constituintes, era a bandeira de minha geração: o jovem de mais de 16 anos ganhava o direito de votar”... Hoje, Aécio e seu partido tenta trazer de volta à Constituição com as reformas esse mesmo “ranço patriarcal” que diz ter se empenhado para retirar da Carta de 1988... Época em que era filiado ao PMDB, partido que deixou para se descolar da crise prolongada do governo Sarney... “Eu me filiei ao PSDB no dia 30 de março de 1989, com direito a uma acolhida afetuosa por parte dos novos companheiros: Fernando Henrique, Mário Covas, Franco Montoro, José Serra, José Richa, Pimenta da Veiga, Ciro Gomes, Arthur Virgílio, entre outros. Assim como eles, eu vinha de um PMDB que perdera seu rumo político e sua dimensão histórica; um PMDB dilacerado entre interesses imediatistas e nem sempre legítimos, que salvo as conhecidas exceções, guardava distância da corajosa brigada de bravos que comandara as Diretas Já e arquitetara, com Tancredo, a aliança que pôs fim à ditadura. Ao nascer, o PSDB trazia de volta à política, em senso ético que fora perdido”... Que o afastou do governo Collor, mas depois do impeachment, em 1992... “A renúncia de Collor, em dezembro, elevou um mineiro à Presidência. Itamar Franco, outro egresso do autêntico PMDB, era calejado o suficiente para saber que não tinha outra alternativa senão ouvir o grito das ruas. Foi o que fez. Buscou de imediato, o apoio do PSDB. A história do Brasil começa a mudar para melhor”... É preciso esclarecer que Itamar, sucedido por Aécio no governo de Minas em 2002, só procurou o PSDB depois que a Câmera autorizou o impeachment de Collor e o vice teve de assumir a presidência... Michel Temer, quando o impeachment de Dilma Rousseff era pouco mais que a expressão da vontade de Eduardo Cunha, já recebia os tucanos no Palácio do Jaburu, para discutir o processo e o futuro governo... Quanto a Itamar, fez o Plano Real, que levou a eleição de Fernando Henrique Cardoso... Cujo apoio foi decisivo para Aécio tornar-se líder do PSDB na Câmara, em 1997, críticas à emenda constitucional que permitia a reeleição à parte...
Aécio comemora a eleição indireta de Tancredo, que não queria um banqueiro no ministério da Fazenda... |
Em meio a um contexto econômico complicado no país, Aécio elegeu-se presidente da Câmara dos Deputados em 2001... “A economia ainda se ressentia dos efeitos da desvalorização do Real, em janeiro de 1999. O processo de privatização sofrera alguns solavancos. A reforma política e a reforma previdenciária pararam num Congresso pulverizado em interesses quase sempre conflitantes. Luís Eduardo Magalhães fazia falta. Seu substituto, Michel Temer, do PSDB, encontrava dificuldades em destravar a agenda da Câmara. A Casa precisava de uma liderança ágil e decidida”... E Aécio, de votos para ser eleito... Se a conjuntura guarda semelhanças com o momento atual, a fórmula encontrada por Aécio para chegar ao comando do Câmara também é parecida... “Eu precisava buscar adesões além do bloco PSDB-PTB. Só com o apoio do PMDB eu chegaria à presidência da Câmara. A futura parceria começou a se desenhar num jantar oferecido pelo deputado Michel Temer, em junho daquele ano de 2000. Não foi formalizado acordo algum, mas a perspectiva era boa. O PMDB buscava apoio para a eleição do Senado, onde Jader Barbalho e Antonio Carlos Magalhães estavam em disputa, inviabilizando qualquer aliança entre PMDB e PFL. As lideranças do PSDB não viam problema em apoiar Jader na eleição para a presidência do Senado. E assim foi feito”... Sem contar uma adesão às vésperas da eleição... “Severino Cavalcanti, do PPB, que se apresentava como candidato do ‘baixo clero’, decidiu me apoiar. Eram 43 votos a mais. Construí um arco de alianças que lembrava aquele de Tancredo, em 1984. O PTB veio, e o PPS também, assim como o PSB”... Por fim, Aécio já foi presidente... Por três dias, em junho de 2001, quando assumiu... A presidência nas ausências do presidente Fernando Henrique Cardoso e do vice Marco Maciel, que viajaram juntos para o exterior... Prometendo não demitir nenhum ministro, no que foi interpretado como uma referência a Itamar Franco, numa das ocasiões em que substituiu Fernando Collor, Aécio tomou outra providência... “Tratei de evitar, por prudência, a maior tentação ao cargo provisório: a própria cadeira presidencial. Em respeito a Fernando Henrique, preferi me instalar numa mesa redonda, na lateral do gabinete. Lá é lugar sagrado: só muitos milhões de votos habilitam alguém a se sentar naquela poltrona”... Um cuidado que deixou de lado, para a infelicidade do Brasil, depois das eleições presidenciais de 2014...
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