Quando era deputado estadual, Manoel... De Nobrega recusou o convite de Adhemar de Barros para ser o prefeito paulistano... |
Em suas andanças pela cidade, o Doutor Kenji descobriu na região da Avenida Nordestina, na Zona Leste, a Escola Estadual Deputado Manoel de Nóbrega... Ao pesquisar na internet de seu celular, Kenji descobriu que o patrono da escola é ninguém menos que o pai de Carlos Alberto de Nóbrega, apresentador do programa humorístico “A Praça é Nossa”, do SBT... Manoel... De Nobrega criou o formato da atração na TV Paulista, anos depois de ter cumprido um mandato de deputado estadual em São Paulo... A história do pai de Carlos Alberto na política é contada no livro “A Luz Que Não Se Apaga”, lançado em 2004 pela editora Novo Século... Quando ele era um garotinho de 9, 10 anos de idade, por volta de 1945, Manoel... De Nóbrega apresentava dois programas de grande sucesso na Rádio Cultura de São Paulo... “’Boa Noite Para Você’, que sempre homenageava alguém ou alguma coisa, e ‘Um fato em foco’, que lhe dava muita dor de cabeça... Nesse programa, o meu pai soltava os cachorros das coisas que estavam acontecendo no país... Mas censura não perdoa!!!... Por ser muito corajoso, ele jamais temeu os resultados das críticas que fazia... Falava de peito aberto... Criticava os aumentos, as injustiças, as perseguições... Era enfim, um porta-voz do povo: o que não podia ser dito nas ruas, ele dizia no rádio... Por conta disso, de vez em quando ele passava uma noite em companhia do ‘delegado vizinho’”... Que era o próprio Secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo... O qual levava Manoel... De Nóbrega para seu gabinete, a fim de prestar esclarecimentos para o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) da ditadura do Estado Novo de Getúlio Vargas... “Isso deu a ele uma fama de justiceiro, de defensor dos pobres e oprimidos... E valeu muitas lágrimas da minha mãe, que temia pela vida dele... Meu pai chegou a ter fama de comunista... O que ajudou um pouco a acabar com essa situação foi o convite do governo dos Estados Unidos para que ele passasse uma temporada, como bolsista, trabalhando na CBS e na NBC em Nova York”... Foi quando Manoel... De Nóbrega recebeu uma carta do ex-interventor federal em São Paulo no Estado Novo, Adhemar de Barros, para ser candidato a deputado estadual pelo Partido Social Progressista (PSP)... “Adhemar iria candidatar-se a governador e queria o apoio, a fama e os votos que o Manoel... De Nóbrega poderia angariar para o seu partido e sua candidatura (...) Quando voltamos de Nova York, em dezembro de 1945, meu pai já era candidato a deputado”... A campanha no interior do Estado foi feita em um Chevroley 1941 azul, equipado com um alto-falante, na companhia do radialista Moraes Sarmento e do “Seu Vilela”, um investigador de polícia que servia como secretário particular... Manoel... De Nóbrega elegeu-se em 1946 com 38 mil votos, uma votação expressiva para a época, e participou da elaboração da Constituição estadual, com Adhemar de Barros no governo do Estado... “Então começaram as decepções... Política é a arte da barganha... É um troca-troca sem moral... Aquilo não era coisa do pai que eu conhecia... Tanto não era que a posição dele era conflitante com os interesses do Adhemar de Barros e do PSP, dando início a brigas e divergências... O Adhemar de Barros tinha uma tal de ‘caixinha do Adhemar’, que era muito comentada na época, alguns privilégios de cassinos abertos clandestinamente... Enfim, a política mudara com o fim da ditadura... Se, por um lado, a ditadura acabou com a liberdade de expressão e com os direitos humanos, a democracia, por outro, também trouxe algumas coisas ruins... E essas ‘coisas ruins’ o Manoel... De Nóbrega não aceitava!!!... As brigas com o Adhemar começavam por aí... Meu pai dizia... ‘Adhemar, abriram um cassino em Campos do Jordão e temos de fechá-lo’... Mas o cassino não era fechado e continuava funcionando escancaradamente... Ele dizia... ‘Adhemar, tem alguns deputados levando dinheiro para aprovar determinadas leis’... E nenhuma providência era tomada a respeito... Enfim, para cada acusação que ele fazia, recebia uma resposta irônica... Ele passou a ser o ‘chato da corte’”... Adhemar de Barros chegou a pensar que Manoel... De Nóbrega “estivesse com ciúmes de Paulo Lauro, um homem de prestígio, que fazia parte do ‘esquema’ e que ia tornar-se deputado” e convidou ele para ser prefeito de São Paulo, cargo então preenchido por indicação do governador... Manoel... De Nóbrega recusou... “O que ele queria na verdade, era ser na Assembléia o que ele era no rádio... Era isso o que o povo esperava dele”... Enquanto Adhemar nomeava o próprio Paulo Lauro para a prefeitura paulistana - anos mais tarde, também daria nome a uma escola estadual, na região do Parque Savoy City - Manoel... De Nóbrega rompeu com Adhemar... “Ele não conseguia mais o tempo para discursar em plenário... Tudo lhe era dificultado... Com isso, o povo, que não sabia os motivos de seu silêncio, começou a ir contra ele... Daí à fama de ‘traidor’ e de ‘aproveitador’ foi um pulo... E outros adjetivos ainda mais pesados começaram a ser jogados contra ele”... Afora a acusação de que era dono de um tríplex... Quer dizer, de um prédio na região da Praça da República... Manoel... De Nóbrega, aceitou o convite de um adversário político de Adhemar Hugo Borghi, e filiou-se ao PTN... Mesmo em um partido professoral – que acaba de mudar seu nome para “Podemos”, em alusão a agremiação espanhola – ele não conseguiu a reeleição... Sem mandato, teve de recomeçar no rádio, em 1950... Após ter a ideia de um programa de variedades recusada pela Rádio Excelsior, foi fazer na emissora de menor audiência na época em São Paulo, a Cruzeiro do Sul (depois Emissora de Piratininga) “Torre de Babel”... Cujo sucesso em 1952 o levou de volta à Rádio Excelsior, que passou a se chamar Nacional quando adquirida por Victor Costa... É nessa época que Boni aprendeu tudo sobre redação de programas com Manoel... De Nóbrega, trabalhando com o redator de novelas Mário Santos... Com quem Carlos Alberto começou a escrever para rádio, escondido do pai, para acompanhar Mário em suas saídas pela noite paulistana...
Inspiração para o "Caro Colega" veio de um mendigo na região da Praça Saens Peña, na Tijuca, Pancada... |
Oficialmente, Carlos Alberto começou a trabalhar na redação dos quadros de humor dos programas de rádio do pai em 1953, quando largou os estudos... Victor Costa, por sua vez, adquiriu a TV Paulista, e em dezembro de 1955 encomendou o projeto de um programa de humor a Manoel... De Nóbrega... Que estava com viagem de férias marcada para Buenos Aires, a qual não poderia adiar por motivos de saúde... Assim, escreveu quatro roteiros para o programa “UFE no ar, UFE no lar”, patrocinado pela fábrica de sabão, e viajou... A estreia foi apresentada por Hebe Camargo, mas mesmo contando com nomes do quilate de Ronald Golias, Borges de Barros e Chocolate, a atração não fez sucesso... Nem mesmo nas três semanas seguintes, quando Carlo Alberto assumiu... O comando... De volta das férias, no final de janeiro, Victor Costa, desesperado para manter o patrocinador, pediu a Manoel que criasse um novo programa...
“Naquele momento, Manoel de Nóbrega imitava Cristóvão Colombo: botou um ovo em pé... O Ovo de Colombo era a simplicidade em forma de programa... Um telão atrás, com a pintura de uma praça do interior, e dois bancos... Mais nada... Como surgiu essa ideia???... Da janela do apartamento do hotel onde estava hospedado, em Buenos Aires, meu pai reparou que do lado de uma banca de jornal, tinha uma pracinha com um banco... E, sentado naquele banco, todos os dias, havia um senhor, que meu pai calculou ser um aposentado, pois várias vezes, durante o dia, lá estava o ‘aposentado’, conversando com um, batendo papo com outro... E aí ele teve a ideia...
Existe coisa mais simples e eterna do que uma praça???... Praça existe em todos os lugares... Sempre houve... Sempre haverá... Sente quem sentar, sempre duas pessoas irão se encontrar numa casa... E o programa foi ao ar... Todas as segundas-feiras, às oito horas da noite, na TV Paulista (hoje, TV Globo)...
Meu pai sentava em um dos bancos da praça, e durante 25 minutos, passavam por ali, sentando-se ao lado dele, tipos inesquecíveis como Golias, Chocolate, Canarinho, Borges de Barros, Moacyr Franco... E também surgiu naquele programa uma mensagem de amor de pai para filho, que marcou nossas vidas... Eu entrava na praça, sentava ao lado do meu pai e começava a falar mal do ‘meu pai’... E ele fazia a mesma coisa, falando do ‘seu filho’... Como todos sabiam que na vida real éramos pai e filho, isso marcou muito (...)
Enquanto isso, na Praça, o Golias ‘explodia’ com o Pacífico, aquele personagem que usa o bonezinho virado de lado... O Chocolate, por sua vez, fazia um morador de favela, que ia falar sobre problemas de pobre... E o Borges de Barros lançava o ‘Caro Colega’, com o mendigo que se dizia amigo de todos os famosos e ricos, que tinha intimidade com políticos, milionários e artistas... Esse personagem foi tirado de um fato verdadeiro... No Rio de Janeiro, na Praça Saens Peña, havia um homem que era quase maltrapilho e se dizia amigos de políticos famosos e de celebridades mundiais... Ele falava com tal convicção que a gente sempre ficava em dúvidas se as histórias eram verdadeiras ou se ele era louco”...
Carlos Alberto lembra que “A Praça da Alegria” era gravada no palco da antiga Rádio Nacional de São Paulo, na região da Rua das Palmeiras, “pois a TV Paulista ainda não tinha estúdios que suportassem um programa de auditório... Então, faziam-se algumas escalas para a utilização do palco... Em determinados horários, era programa de televisão... Em outros, programa de rádio... Coisa de louco”... Vide o faxineiro apelidado de Talento e Formosura, escalado para trazer Canarinho em um carrinho de mão, internauta Pedro Henrique, e que ao ouvir o agradecimento de Manoel... De Nóbrega, começou a discursar em pleno palco, fazendo a plateia se acabar de rir... Zilda Cardoso entraria no programa no programa dizendo para Manoel... De Nóbrega... Que tinha sido indicada pelo diretor artístico das radionovelas da Rádio Nacional, Paulo de Gramont... Amigo de Manoel, mas que sequer a conhecia... “Eu faço uma mulher escrachada, que fuma negocio, fala gíria, joga capoeira e não tem medo de homem... É uma espécie de Pacífico-mulher”... Era a Catifunda, que interpretou para Manoel... de Nóbrega e entrou na Praça... Inclusive quando o programa começou a ser produzido e exibido na TV Rio às terças-feiras, em 1958... Na Record, a Praça teve o reforço de Walter D’Avila, o Homem do Livro... “Insubstituível. Ninguém faria igual”... Rony Rios, a Velha Surda... “Falava-se em Praça, falava-se da Velha Surda”... Consuelo Leandro, a Mulher do Oscar... “Aquela milionário cafona, apaixonada pelos poderes do marido, que era podre de rico”... Simplício... “Fazendo o garoto que dizia ‘Ô, Home!!! Ou o caipira mentiroso”... Walter Stuart, Durval de Souza... A grande audiência fazia com que o diretor-geral da Record, Paulinho Machado de Carvalho, fosse demovido de sua recorrente intenção de tirar o programa do ar... Com o regime militar implantado no Brasil com o golpe de 1964, vieram os problemas com a censura... Quando um censor implicou com um texto em que o Caro Colega citava uma poesia de Castro Alves, aquela do “Auriverde pendão da minha terra” que o Jayme Filho não conseguiu recitar com sotaque português na “Escolinha do Professor Raimundo”, Manoel... De Nóbrega compareceu em Brasília, “falar com quem é de direito”... “Desse dia em diante, nunca mais teve censura na Praça... Era o único programa da televisão brasileira que não tinha vigilância moral e política”...
Parceria entre Manoel... De Nóbrega e Ronald Golias rendeu até anúncio do suco de tomate da CICA... |
“Mas como tudo um dia acaba, a Praça terminou”, lembra Carlos Alberto... “Com a doença do meu pai (os seus problemas de saúde já estavam começando...) e os incêndios da TV Record acontecendo ano após ano, a Praça acabou... Acabou???... Duvido... Quando saímos da TV Record e fomos trabalhar no SS Studios (hoje SBT...) o Silvio ainda tentou colocar o programa dentro do seu domingo, mas o meu pai estava muito mal de saúde, sem condições de continuar fazendo o programa... Então a Praça terminava para sempre... Para sempre??? Duvido”... A mudança de Manoel... De Nóbrega da Record para o programa de Silvio Santos, na época exibido pela Globo, aconteceu em decorrência da ajuda que Silvio deu a ele para saldar as dívidas feitas com empreendimentos mal-sucedidos – Baú da Felicidade começou assim - como um negócio de travas de segurança para carros...Quando Manoel... De Nóbrega teve um câncer de pâncreas diagnosticado, Silvio pagou todas as despesas com tratamento médico... Ou como conta seu filho...
“Ele, dirigindo o seu carro, voltou-se para mim e disse:
- Você sabe que o seu pai não chega ao Natal, não sabe???...
O Silvio vê a vida de uma forma totalmente diferente da minha... Eu sabia que mais pai não chegaria ao Natal, mas era tudo o que eu não queria saber... E o Silvio continuou...
- O que é que a gente pode fazer com ele???...
- Silvio, está para sair a sua televisão... Certamente, papai não vai vê-la funcionando... Porque você não dá um cargo importante pra ele na televisão???...
O Rubens de Albuquerque, um grande amigo, já tinha dado essa ideia e o Silvio, concordado... Logo em seguida, Silvio recebeu a concessão do canal, lá em Brasília... Meu pai estava muito mal... Mas, mesmo assim, foi a Brasília, com o Silvio e o Luciano Calegari, receber a concessão de um canal no Rio de Janeiro... Manoel... De Nóbrega era, então, o presidente da emissora... Dias depois, ele não saía mais da cama... Seu fim chegava rapidamente...
O Silvio, além de pagar todas as despesas necessárias ao tratamento do câncer, ainda deu ao meu pai um salário de um diretor geral de televisão, salário esse que meu pai recebia em casa (...) Fiquei 11 anos sem falar com o Silvio... Por imaturidade minha e cabeça-dura dele nos afastamos”... A reconciliação aconteceria apenas em 1986, intermediada por seu tio Fernando, que era médico e tratou a filha mais nova de Silvio... E seria consolidada no ano seguinte, quando Silvio tirou Carlos Alberto da “Band”, onde fazia “Praça Brasil” para apresentar “A Praça é Nossa”, no SBT... O velho e querido banco, no entanto, voltaria a atividade em 1977...
“Um ano depois da morte do meu pai, em 1976, eu já estava na Rede Globo, escrevendo e participando do programa ‘Os Trapalhões’... Fui falar com o Boni...
- Boni, dia 17 de março vai completar um ano da morte do meu pai... Dá pra Globo mandar fazer uma missa, pedir pra colocar no ‘Jornal Nacional’, só para não passar em branco o primeiro ano da morte dele???...
- Não... Claro que não... Seu pai era um homem alegre... A gente tem que se lembrar dele com alegria... Dia 17 que dia é???...
- Quarta-feira...
- Quarta-feira é dia do ‘Chico City’... Vocês são tão amigos... Pede pro Chico ceder um bloco do programa dele e você faz a Praça nesse espaço...
Saí da Globo e fui voando até a casa do Chico... Lá estava o Carlos Manga, então diretor do ‘Chico City’... Eu disse a eles a ideia do Boni... Estávamos na semana que antecedia o Carnaval...
- Nada disso – falou o Chico – Vamos fazer o programa inteiro com a Praça...
O Manga reforçou a ideia, dizendo:
- Vá para São Paulo e, quarta-feira que vem (quarta-feira de Cinzas...) , me traga um programa pronto...
E o Chico completou...
- Vamos fazer, nós dois, aquele quadro que você fazia com seu pai... Só que, em vez de falar de pai e filho, você fala mal do Chico Anysio que eu falo mal do Carlos Alberto...
E lá vim eu para São Paulo... No avião, comecei a pensar se a ideia do Chico não iria trazer mal-entendido, porque muita gente nem se lembrava mais do papo de pai e filho.. Quando cheguei em casa telefonei pro Chico...
- Chico, você não acha melhor mudar a minha entrada???... Eu tive uma ideia... Quando terminar o quadro do Golias, eu entro, você olha pra mim e eu digo... ‘O senhor me dá licença... Esse lugar é meu’... Então você entrega o jornal e sai... Assim que você sair, o Beto (meu filho mais velho, na época com 11 anos) entra, olha para mim e diz... ‘Meu pai não me entende mesmo’... Congela a imagem e entra a música da Praça... ‘A mesma praça, o mesmo banco’...
Era o Chico chorando no Rio e eu em São Paulo...
O programa foi ao ar... O sucesso foi tão grande que, na semana seguinte, quando eu cheguei na Globo para fazer ‘Os Trapalhões’, tinha um recado do Boni para que eu o procurasse... Qual foi minha surpresa quando o Boni disse...
- O Roberto Marinho viu e adorou o programa... Ele quer que a gente faça a Praça toda semana... Vá pra São Paulo, contrate quem você quiser e comece a preparar o programa com o Mário Lúcio...
E a Praça da Alegria voltou... Dois anos depois acabou... Para sempre...
Para sempre???... Duvido”... Pancada observa que o depoimento de Carlos Alberto confirma que a reprise do especial “Praça da Alegria” do “Chico City” no Viva cortou o quadro do Golias... Alis, a parceria entre Manoel... De Nóbrega e Ronald Golias não se resumiu ao professor Bartolomeu Guimarães... Vide viagem que fizeram
aos Estados Unidos com Carlos Alberto, a passagem do Golias paga por meio de permuta com uma ótica, o pulinho de Golias em Hollywood, seu pedido de melão no hotel, muito antes de Dom Lázaro Venturini, o urso de pelúcia gigante de 50 dólares que fizeram por 38... Uma das poucas lembranças da dupla na frente das câmeras é um comercial do Suco de Tomate da CICA...
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