segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

TVBR7.0BIS (I): Roberto Guilherme na Saideira da Tupi...

Roberto Guilherme lembrou do tempo de para-quedista para pedir ao governo militar que anulasse cassação da concessão...

























































(Publicado Originalmente em 31 de agosto de 2020) No último dia 8 de julho, o usuário do Youtube © Video Achieves Brazil postou um vídeo cujo valor histórico é incalculável... O registro dos últimos 47 minutos de transmissões da TV Tupi do Rio de Janeiro, a segunda emissora de televisão inaugurada no Brasil, antes dos transmissores serem lacrados em cumprimento ao decreto que revogou a concessão da emissora, em 18 de julho de 1980...  Desde as 20 horas do dia anterior, depois do presidente João Figueiredo, o último da ditadura militar, ter assinado o decreto, os trabalhadores da Tupi carioca se reuniram nos estúdios da emissora, na região de Urca, e iniciaram uma vigília, transmitindo ao vivo ininterruptamente e pedindo a Figueiredo que reconsiderasse a decisão - havia também a possibilidade da administração das emissoras do Rio, Fortaleza e Recife, estas duas sem os graves problemas financeiros dos canais paulista e carioca (que ainda tinha algum alívio proporcionado pelo fechamento anterior de outras empresas dos "Diários Associados" no Rio, como a revista "O Cruzeiro", pela injeção de recursos da Rádio Tupi e pelo aluguel de horários...), ser entregue a uma comissão de funcionários, o que encontrava amparo na legislação da época, que só contemplava a cassação em caso de falência da emissora e previa a nomeação de interventores, como demonstrou anos depois a ação judicial contra o governo movida pelos Diários Associados, proprietários da rede, com sentença favorável no caso da emissora de Recife...  Lembrando que nessa época, as decisões sobre renovação ou não de concessões de emissoras de televisão cabiam exclusivamente ao poder executivo, a renovação das principais concessões da Tupi estava pendente desde 1977 e a administração colegiada era interessante no caso carioca, pois a maior parte dos horários estava alugada a terceiros... Na ocasião, a Tupi de São Paulo, primeira emissora a operar no país,  apenas retransmitia a programação gerada no Rio de Janeiro (desde fevereiro, quando toda a produção de programas nos estúdios da região do Sumaré foi encerrada, vide novelas interrompidas...), uma vez que os trabalhadores estavam em greve há mais de dois meses devido aos atrasos no pagamento dos salários, Humberto Mesquita... Um reflexo da falta de diálogo entre as direções paulista e carioca da emissora, que disputavam o comando da rede, uma rixa que vinha desde a criação do condomínio dos Diários Associados para administrar o conglomerado de mídia criado por Assis Chateaubriand... Onde os condôminos eram vitalícios, mas a participação não era hereditária, o que levou a sérios desfalques nos recursos do grupo, além de uma gigantesca sonegação de contribuições previdenciárias... No dia 14 de julho de 1980, os funcionários que cuidavam da retransmissão do sinal do Rio também entraram em greve, o que forneceu um pretexto para a cassação da concessão, pois legalmente a emissora não poderia ficar mais de 24 horas fora do ar... Embora o postador do vídeo não dê maiores informações sobre a origem, comenta-se que pela qualidade da imagem, provavelmente se trata de uma gravação da transmissão original feita no sistema U-Matic - e gravações feitas "por baixo do pano" dentro das emissoras eram bastante comuns naquela época... O vídeo começa com um funcionário pedindo emocionado ao presidente que respeite as lágrimas dos trabalhadores e mantenha a emissora no ar, diante de uma bancada com advogados e deputados, cercados por empregados da emissora... Uma telespectadora relata que acompanhou a vigília e diz que ainda resta Deus e graças a TV Tupi não abandonou Ele... Uma alusão aos programas religiosos dos últimos tempos da emissora???...  Lembrando que começaram a aparecer no Youtube ® vídeos digitalizados pelo Arquivo Nacional, do acervo da TV Tupi carioca e postados por usuários do site, do programa “O Despertar da Fé”, apresentados pelo missionário RR Soares – o próprio – no tempo em que ainda pregava junto com seu cunhado Edir Macedo... Voltando aos estúdios na região da Urca, uma figura conhecida pede o microfone... É  Edward Guilherme Nunes da Silva, mais conhecido como Roberto Guilherme, que trabalhava forte nos programas humorísticos da Tupi (no Youtube © há um anúncio da estreia do “Apertura”, no intervalo da transmissão do desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro, em 1980, em que ele comparece ao lado de Jaime Filho...) trajando um figurino safári... O futuro intérprete do Sargento Pincel em “Os Trapalhões” começa a falar: “Tranquilo... Uma das coisas que eu sempre fui na minha vida e aprendi, calmo, tranquilo, eu já passei por vários canais desse Brasil, os maiores programas de audiência eu tive prazer e o orgulho de fazer, de fazê-los, de cria-los, aprendi duas coisas na vida... Uma, foi envergar a farda verde deste país, na força armada,  como para-quedista do exército, durante oito anos, e representar o meu verde e amarelo no exterior como para-quedista, durante os oito anos que lá estive... Confesso que o mesmo orgulho que eu tinha naquela época, o rapaz para-quedista, esse mesmo orgulho, hoje, agora, essa senhora telespectadora que veio, ainda resta Deus... Será que é possível mesmo que nós temos que tirar o pé do chão pra ir tão alto, quando vimos recentemente, há poucas semanas atrás, alguém chegar e beijar esse mesmo chão, o mesmo chão de uma terra que está predestinada, no ano 2000, a ser o celeiro de uma nova humanidade... Se tiver que fechar isto que aqui está, meu Deus do céu... Não é a TV Tupi, não é o funcionário da TV Tupi que eu sou há onze anos de idade e visto essa camisa desde ontem em pé, barbado, eu que sempre entrei na sua casa, telespectador”... Um letreiro percorre a tela... “TV TUPI, ONTEM, HOJE E SEMPRE – QUEREMOS TRABALHAR”...  Meu querido presidente da república, vocês, comandantes deste país, que eu há 21 anos atrás, largara esta farda verde, orgulhoso, orgulhoso aqui estou em pé, com a minha arma que é este microfone, é esta lente, eu não tenho a arma que os senhores tem, o poder que os senhores têm de comandar 120 milhões de brasileiros, legislando, mas tenho o poder de comandar através desde microfone, desta lente, a alegria de 120 milhões de brasileiros, não sei quantos milhões de crianças, velhos, doentes, pessoas que estão, garanto, estão em casa agora, chorando, como o meu filho, que eu não vejo desde ontem, está, presidente”... A câmera focaliza a atriz Zezé Macedo, e Roberto prossegue... “Aquele mesmo orgulho que um dia defendi, a farda que o senhor hoje veste, eu lhe peço daqui, deixe esta empresa no ar, entregue a nós funcionários, uma comissão nossa de companheiros deve estar neste momento conversando com o ministro das Comunicações... Nós não estamos pedindo nada de mais, nos dê apenas o direito de defender uma coisa que é nossa, porque torno a repetir, nós funcionários não devemos um tostão a União, nós fomos descontados em todo o nosso salário, mensalmente, agora, se não foi depositado, não é problema nosso, nós não temos culpa, eu pergunto, não quero em hipótese alguma aqui agredir ninguém, mas pergunto eu, se alguém do lado rouba alguma coisa, eu tomo conhecimento, a justiça me enquadra como conivente... Vou só fazer uma pergunta pra esta população, a 120 milhões de brasileiros... Será que ninguém sabia  que os nossos direitos lá não estavam???... Ou será que a tão falada, a tão elevada justiça, a balança, cega, é tão cega assim???... Presidente, o senhor vê, olha aí, eu que sempre fiz o povo sorrir, eu lhe gostaria de ver aqui, onde há onze anos levo alegria para este povo, gostaria de estar lhe vendo agora fazendo isto... Mas eu tenho certeza do bom senso e continuo a acreditar ainda na dignidade, na perseverança das pessoas, eu não quero ir tão alto, a Deus.. Vou pedir ao senhor, seu presidente, nós estamos caminhando pro corredor da morte, o senhor, como todo presidente autêntico, com aquela dignidade, com aquela pujança que o senhor demonstrou ao assumir o comando deste país, pode, através de uma palavra sua, nos salvar da morte que estão prestes a nos executarem aqui”... Roberto é aplaudido e a palavra é passada a um produtor e diretor identificado como Carlinhos... Que começa a falar de um rapazinho mancando na porta do Plaza na região da Prado Júnior, um rapazinho feio que tinha um conjunto em Niterói, um rapaz mulato simpático que compôs uma musiquinha... Ou seja, de como introduziu na Tupi Roberto Carlos, Sérgio Mendes e Jorge Ben para demonstrar como a emissora sempre deu oportunidade aos novatos, além de formar profissionais que hoje trabalham forte em outras estações... “Eu não tenho nada contra a Globo, contra as outras emissoras, mas aqui a gente vive um clima de muita amizade, de muito amor”... Ainda assim, Carlinhos considerava que o decreto do governo era irreversível, prometendo que seguiria lutando... Antes de um amigo do filho do presidente Figueiredo falar, um funcionário mostra sua camisa da TV Rio, emissora que teve a concessão revogada em 1977, dizendo que ninguém recebeu nada... O amigo, um português chamado João Batista, diz que apresentou o Castelinho, como relações públicas, no programa de Aérton Perlingeiro, fala a Paulinho – o filho do presidente – para pedir ao pai (e a mãe...), que não fechem a Tupi, que é a voz do povo... Na bancada, um dos homens de terno informa que restam cinco minutos de programa, e pede o depoimento de alguém da técnica... Um funcionário chamado Valdir aproveita para questionar o advogado Laercio Pellegrino sobre a possibilidade da administração da Tupi ser punida, já que a cassação da emissora é uma punição aos funcionários...  Depois de elogiar a laborterapia na recuperação de condenados, Laercio diz que não consegue conceber que tanta gente fique sem trabalho e o presidente não vai punir ninguém por ato que não foi praticado, e o ato administrativo pode ser revogado, sem contar os crimes econômicos da direção da emissora... Logo depois, se pronuncia o deputado Evaldo Saramago Pinheiro pede que pensamentos e orações subam aos céus e desçam ao presidente para não desamparar os funcionários da Tupi... Os presentes começam a cantar o Hino Nacional Brasileiro...

























































Depois de anunciar que os técnicos responsáveis pela lacração chegaram na emissora, Roberto cantou o Hino Nacional...

























































Quando é cantando o primeiro verso do hino, Roberto Guilherme pega o microfone e anuncia:  “Olha, nós recebemos uma comunicação que as pessoas responsáveis para dar a estocada no nosso coração, que é o cristal vermelho, já estão no alto do morro da Urca... Povo do meu pais, povo da Guanabara, nós funcionários da Rede Tupi de Televisão estamos prestes a ser estocados, e o nosso sangue derramado... São brasileiros que tão cantando, pedindo para trabalharem, e cantando, vão até o final, me permitam cantar junto com os meus irmãos, junto com os meus companheiros”... E passa a cantar... “A imagem do cruzeiro resplandece”...  Acabado a primeira parte do hino, volta a falar... “É isso aí, não é só funcionário... São brasileiros por todo esse país que estão conosco cantando”... Logo em seguida, outro funcionário pede uma prece para que alcancem o objetivo de continuar trabalhando... O hino prossegue, e pode-se ouvir uma pessoa chorando... Uma bandeirinha do Brasil aparece em close e ao final do hino, um grito: “Viva o Brasil!!!”... Um funcionário toma a bandeirinha, agitando-a no ar e a imagem passa para o auditório, onde está o apresentador Ary Soares, que fala:  “Boa tarde, Brasil, boa tarde Rio de Janeiro, boa tarde meus amigos do ‘Aqui e Agora’”...  Programa criado por Wilton Franco em 1979 e que seria retomado na TVS Rio – a estreia aconteceu quatro dias antes, em 14 de julho - e depois no SBT, quando a emissora iniciou suas atividades, em agosto de 1981, com o nome de “O Povo na TV”, e que também era veiculado em um horário alugado, indicando que os principais condutores da vigília foram exatamente os "inquilinos" de horários, caso de Jorge Perlingeiro, o próprio, como veremos mais adiante... “Boa tarde meus companheiros da Rede Tupi de Televisão... A qualquer momento, a qualquer momento, nós vamos sair do ar... Uma coisa eu quero deixar bem clara... É o espírito do ‘Aqui e Agora’, que mesmo fora do ar temporariamente, vai continuar trabalhando, vai continuar servindo a comunidade... Você pode vir aqui, nós estaremos aqui, aquele horário completo, desde de manhã cedo, você pode vir aqui todo dia que nós estaremos aqui  atendendo você... Vamos continuar o programa, não sei, talvez seja a última palavra, mas uma coisa, não desligue, porque nós queremos que você assista, que você assista a nossa saída ou permanência no ar... Boa tarde Brasil, boa tarde Eliana”... Eliana Mattos, a outra apresentadora do programa, tem a palavra:  “Boa tarde, Ary, boa tarde, Brasil, um maravilhoso boa tarde aos funcionários da Rede Tupi de Televisão... Eu estou com vocês, estive com vocês ontem, não aqui, mas em casa,  chorando, vibrando, e fazendo uma corrente de pensamento positivo... Eu sei que vem por aí coisa boa, porque eu sempre tenho como mensagem, como esperança, um sorriso de alegria para todos vocês, vamos confiar para que tudo dê certo, e nós do ‘Aqui e Agora’ mais do que nunca, estamos com vocês... Porque eu sempre digo, o nosso programa ama você acima de tudo, boa tarde”... Mais um apresentador, André, fala:  “Boa tarde amigos do Rio, como disse o Ary, a qualquer momento poderemos sair do ar”... Ouvem-se aplausos... “Mas é importante, vamos sair do ar, não importa, o importante é que todos nós neste momento fiquemos de mãos dadas, porque ainda estamos aqui... Daqui a pouquinho eu estarei com vocês no programa ‘Aqui e Agora’”... A imagem abre focalizando o palco cheio de gente enquanto é inserido na tela o logotipo do programa, ao som de música orquestrada... Ary diz que é a movimentação do pessoal vindo de outro estúdio, chegando para iniciar o programa no auditório...  “É a mesma coisa, só que os nossos companheiros da Rede Tupi de Televisão, que estão pedindo, pedindo, pedindo somente, que passaram a noite inteira pedindo ao senhor presidente da república que lhes dê apenas uma coisa, o direito de poder continuar trabalhando, somente isso... Eu disse na madrugada, que as palavras às vezes exageradas ou mais agressivas que aconteciam aqui, ou aconteceram aqui, já é uma vitória, tanto do presidente Figueiredo quanto do pessoal da Tupi, sabe por que, porque é a abertura que ele propõe, nós estamos aqui pedindo isso, só, é isso que os funcionários querem, o direito de poder continuar trabalhando, gerando serviço, para que todas essas pessoas, que os senhores durante uma noite toda acompanharam, possam continuar trabalhando... Permaneçam aí sentados, porque aí atrás de vocês tem um conjunto”...  É o conjunto Água, de música andina, a quem o apresentador pede para que se posicione atrás da plateia para tocar na abertura do programa... Atrás de Ary, uma mulher chora...  “Hoje, como sempre, trazendo as alegrias, as tristezas, um minutinho, trazendo as alegrias, trazendo as tristezas de uma cidade, de um Estado, a preocupação de uma família, de um pai, de uma mãe, de um irmão”... André interrompe a fala e diz: “Eu quero dizer o seguinte, fazer aqui também um apelo às agências de publicidade, caso o governo venha a conceder o canal 6 a esses funcionários, para que eles continuem com esses amigos, com esses irmãos, com essa família, apoiando o trabalho que será desenvolvido por essa gente tão humilde e que só quer trabalhar, como foi a campanha feita durante toda a noite, que os amigos continuem prestigiando esse trabalho, isso é muito importante pra que possamos transformar a TV Tupi num amanhã maravilhoso, glorioso, como ela deveria sempre ocupar”... O público aplaude e Ary quer que o grupo comece a tocar, mas é interrompido novamente: “Deixa eu falar uma coisa... Senhor, presidente, escuta, o negócio é o seguinte, eu espero que essa decisão não tenha sido do presidente, nós queremos a decisão do homem João Figueiredo, não do presidente João Figueiredo... Esse pessoal todo aqui vai morrer de fome, pô!!!”... Mais aplausos e o conjunto Água começa a tocar...  Durante a apresentação são mostrados os rostos dos funcionários  na plateia, a maior parte chorando... Então é por isso que terminado o número, o apresentador diz que os músicos demoraram para se apresentar porque se juntaram ao choro dos trabalhadores... Também pede a André que vá chorar com eles, e enquanto ele fala, uma pessoa desmaia e precisa ser retirada do palco... Ary diz que o desmaio é consequência das pessoas terem passado a noite em claro e pede para que um dos músicos do grupo se pronuncie... E ele o faz falando português com sotaque espanhol:  “Para nós, a gente se encontra no momento junto com vocês, vendo o que as pessoas estão vivendo, sentindo o que as pessoas sentem, por estar sem emprego, sem trabalho, e realmente para nós é uma surpresa encontrar a vocês dessa forma”...


























































Última atração exibida pela TV Tupi carioca foi um programa criado por ninguém menos que Wilton Franco, o próprio...

























































Ary agradece ao músico e passa a palavra para a atriz Wanda Lacerda, presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos do Rio de Janeiro... Ela desculpa-se pelo atraso e na tela aparece o letreiro... “ATÉ BREVE TELESPECTADORES AMIGOS REDE TUPI”... Wanda coloca o Sindicato à disposição de todos os trabalhadores e fala em uma reunião com a imprensa, que acabou adiada por uma série de desencontros... A fala da atriz é cortada e entram imagens da missa rezada no Aterro do Flamengo pelo Papa João Paulo II... O Papa pede aos fieis que se arrependam de todos os pecados e o letreiro volta a tela... “ATÉ BREVE TELESPECTADORES AMIGOS REDE TUPI”... A fala do Papa é cortada, e entra a narração do locutor Cévio Cordeiro:  “Senhor presidente... Quem fala daqui do Rio, em nome do povo desta Tupi, daqui do Rio, mas em nome do povo da Tupi do Recife, daqui do Rio, mas em nome do povo da Tupi do Ceará, é um seu fiel, é um seu amigo... Queremos João de Deus, João de Brasília, que nós nos escutem, enquanto nós relembramos vocês dois na maior reunião que essa terra já fez... Nós estamos doentes, João, muito doentes... Na iminência de uma morte sem recurso, erguemos uma prece a você, João de Deus, e um apelo a você, João presidente... É difícil que João de Deus nos ouça daqui de longe, mas pelo que ele representou nos dias em que esteve aqui, a nossa fé poderá chegar ao Vaticano, igual a uma mensagem via satélite, e tocar de novo o coração atlético do Papa... Para você, João presidente, é mais certa a nossa mensagem, mais fácil entender o nosso apelo, meu caro presidente, é uma história muito simples, meu caro João, uma história muito fácil de se entender... Ela começa com o clássico era uma vez... Era uma vez, meu caro João presidente, um velho paraibano que resolveu fundar um império de comunicação social... Pioneiro como todos, amou a ideia e a executou, substituindo o planejamento tão necessário pelo entusiasmo da realização... Esqueceu-se que um dia poderia ficar doente, morreria, e o seu império também poderia ficar doente e poderia morrer também... Esse paraibano, João presidente, nunca imaginou porém, que sua ideia luminosa, seu sonho de ouro, viesse a se transformar num pesadelo para a gente inocente, pra milhares e milhares de famílias, homens, mulheres, moços, velhos, crianças... Mas João, aconteceu... Não vou contar o lado feio, sujo, desta história, porque sei que ela é do seu conhecimento, presidente João... Há porém uma coisa, que talvez não tenham contado pra você...  Coisinha para muitos sem qualquer valor, mas para nós da família Tupi, é primordial... Ontem, João presidente, depois de menos de quinze dias que o outro João, o de Deus, que pregou a paz, que defendeu os direitos humanos, que execrou as diferenças sociais, que riscou em definitivo em suas falas a palavra necessidade, que clamou aos homens, inclusive a você, o xará João Presidente, pois bem, depois de menos de 15 dias da visita do Papa, milhares de brasileiros estão desorientados, olhos cheios de lágrimas, cabeças rodando, falando palavras sem nexo, com vergonha de voltarem para casa e terem que dizer aos filhos, estou desempregado... Pois bem, João presidente... Ontem foi feito o decreto que hoje você assinou, cassando as emissoras da Rede Tupi... Por que, João presidente???... Por que foi feito isso conta esses seus amigos, gente que nunca fez mal a ninguém, gente cujo crime hediondo, e por isso recebeu tamanho castigo, tem a mania de querer trabalhar, meu caro presidente... Por que, João presidente, nós vamos pagar pelos desmandos de outros... Que será de todos nós sem emprego, vagando pelas ruas, estendendo as mãos a caridade pública, gente de mais de 30 anos de trabalho, gente sofrida, gente que gastou toda uma vida aqui dentro, e que como prêmio pelo seu amor, pela sua dedicação, ganha na velhice e medalha de ouro do desemprego, meu bom presidente... Por que nós, filhos de uma família doente, mas que lutamos pela sua sobrevivência, somos condenados a morte porque os nossos pais fizeram o mal... Como se pode estender aos filhos os desmandos dos pais, se aqueles sempre suportaram as vicissitudes trabalhando, suplantando a fome e a miséria com as provas irretorquíveis de consideração e apreço... Como, meu presidente, o que vamos dizer às nossas mulheres, com que cara vamos chegar em casa e dizer aos nossos meninos... Hoje não vamos comer porque os patrões não cumpriram a sua parte com o governo, e  o governo fechou a nossa emissora... E o que vamos dizer a esses meninos se eles perguntarem, meu bom presidente... Mas papai,  se o senhor sabia que a casa não prestava, por que não a deixou antes que atingisse tal ponto???... E o que diremos, meu bom presidente... Vamos nos dirigir ao senhor solenemente, como se lêssemos uma petição, senhor presidente... Senhor presidente João Baptista Figueiredo... Com essas imagens do Papa, também João”... Entram imagens dos estúdios na região da Urca, tomadas por funcionários... “Os empregados da Rede Tupi, suas famílias, esses seus mais humildes amigos”... Voltam as imagens do Papa... “Vem pela presidente, solicitar de vossa excelência”... A imagem de novo volta para os estúdios, muitos trabalhadores são focalizados chorando... “Que modifique os termos do decreto que cassou as nossas emissoras... Sabemos das razões de direito que cercam o ato de Vossa Excelência... Nós apelamos para o seu coração e para equilíbrio do supremo chefe deste país, a fim de que encare os pontos seguinte:  Primeiro, quem estará punido com o ato de Vossa Excelência não será apenas o patrão inadimplente... Segundo, o mal desta emissora, e de todas desta rede, não reside entre nós empregados... Terceiro, não há qualquer explicação par ficarmos sem emprego, nós que lutamos para manter a casa, que não aderimos a qualquer movimento de paralisação de trabalho, que suportamos os anos de amargura, de angustia, quando a fome rondou as nossas portas... Quarto, não podemos ficar sem trabalhar, senhor presidente, porque estaríamos engrossando a uma grande massa de desempregados e ociosos, começando uma onda de comoção nacional,  multiplicando a multidão dos inquietos, dos insatisfeitos, que por necessidade, por fome, descambando, em muitos casos, para as veredas tortuosas do mal, a fim de suprir a família carente de tudo... Quinto, senhor presidente, nós queremos arcar com a responsabilidade sozinhos deste nosso pedido... Ficamos a frente dos destinos dessa casa, e por nossa conta, tentaremos gerir nossa própria vida... Afinal, senhor presidente, quantos e quantos aventureiros passaram por aqui, por Pernambuco, pelo Ceará, Minas, e esses nada fizeram de bom, tanto assim que a situação chegou a esse ponto... Rogamos a Vossa Excelência que autorize a manutenção de nossos transmissores no ar, senhor presidente... Imploramos que nos permita continuar trabalhando, sabemos das dificuldades que nos esperam, dos problemas que virão, estamos acostumados a eles, senhor presidente, porque esta casa sempre foi assim e nós já sentimos em nosso sangue que estas dificuldades fazem parte de todos nós... É a tal assertiva, senhor presidente, ruim com a Tupi, pior sem ela... Só queremos, Vossa Excelência, que nos deixe trabalhar... Aqui, do mais humilde dos companheiros ao mais famoso dos colegas, só há um pensamento, continuar trabalhando... A fome pode ser reduzida com a esperança de dias melhores... Se esta casa continuar trabalhando, Vossa Excelência sabe, senhor presidente, e isto é muito antigo, que enquanto há vida, há esperança... Até no evangelho há uma parte que Davi, o salmista, dirige-se ao Senhor e diz: De que vale o meu corpo morto, de que vale o testemunho de um morto... Quando poderei dar graças ao Senhor se o meu corpo está morto, meu Deus... Senhor presidente, em nome desta pátria que Vossa Excelência comanda, em nome de um povo que acredita na sua justiça, em nome de uma nação inteira que reconhece seus sentimentos humanitários, em nome de Deus, senhor presidente, reveja a posição e nos conceda o direito de continuar trabalhando... Se nada do que invocamos, o povo, a nação, nem mesmo o Senhor, se nada disso interessar, pelo menos, senhor presidente, em nome de nossos filhos, de nossas esposas, filhos iguais aos seus, netos iguais aos seus, amigos iguais aos seus, em nome de tudo aquilo que Vossa Excelência achar que é válido, nós rogamos a sua ajuda... Nem Deus poderá fazer o milagre, nem mesmo o outro João, o Papa atleta, ou atleta de Deus, desta feita, senhor presidente, só Vossa Excelência poderá nos salvar... Receba os agradecimentos dos empregados da Rede Tupi, em seu nome, de suas esposas, de seus filhos, cujo único desejo, cuja única reivindicação é trabalhar”...  Um dos câmeras do estúdio é focalizado em close, chorando... “Deixe-nos trabalhar senhor presidente, senhor presidente João Baptista de Oliveira Figueiredo, só isso que desejamos... Vossa Excelência é a única pessoa capaz de realizar este milagre... Nem João de Deus seria capaz de fazê-lo, só o João de Brasília... Deus o abençoe, senhor presidente”... Após uma panorâmica dos funcionários no estúdio, entra um slide com o logotipo da Tupi, um “T” estilizado, criação de Cyro Del Nero, com as cores da bandeira brasileira... Os dizeres “ATÉ BREVE TELESPECTADORES AMIGOS REDE TUPI” saem da tela e entra uma música instrumental – “Victory At Sea”, segundo a descrição do vídeo – junto com o som de aplausos... Por fim, o sinal da emissora sai do ar, correspondendo ao momento que o transmissor foi desligado... Conforme a reportagem exibida pela TV Bandeirantes, o engenheiro do DENTEL, de terno e gravata, comunicou por rádio que ia realizar a lacração do transmissor e um funcionário da Tupi disse que cumpriria as ordens assim que terminasse o VT da missa do Papa... “As últimas imagens foram de muita tristeza, os funcionários choravam enquanto era lida uma mensagem ao presidente Figueiredo”, relatou o locutor Ronaldo Rosas, que também narrava os cinejornais da Empresa Brasileira de Notícias, antiga Agência Nacional, na época... Entra um trecho da carta lida por Cévio Cordeiro... “Senhor presidente, nós queremos arcar com a responsabilidade sozinhos deste nosso pedido... Ficamos a frente dos destinos dessa casa, e por nossa conta, tentaremos gerir nossa própria vida”... Quando entra o slide, o funcionário avisa ao engenheiro que a emissora sair do ar... “Depois os técnicos do DENTEL retiraram as peças vitais ao funcionamento da emissora e lacraram os transmissores”... Segue-se um close do momento em que os lacres são colocados, vide mãos segurando o alicate... A matéria da Bandeirantes era um dos poucos registros do fim da Tupi existentes no Youtube © antes do aparecimento do vídeo da última transmissão - alguns deles somente em áudio, por exemplo, a gravação onde Fernando Chateaubriand, filho de Chatô, apela a amizade do pai com o pai do presidente, Euclides Figueiredo e é convidado a integrar o grupo de funcionários que passaria a responder pelas emissoras de Fortaleza, Recife e Rio... Em outro trecho da vigília, este com áudio e vídeo, o apresentador Jorge Perlingeiro - o próprio - diz que 2.000 mil telegramas tinham sido enviados ao presidente Figueiredo pedindo a anulação do decreto da cassação e anuncia uma apresentação de "Carinhoso" no trompete e no piano... Outro vídeo, postando por Jorjão Henriques, antigo funcionário da Tupi, era uma fita "master" de uma reportagem feita pela atriz Neila Tavares (que na tarefa teve a ajuda da companheira de profissão Ângela Leal...) - segundo ele, encontrada numa lata de lixo (!!!) da emissora local da Band, a TV Guanabara - sobre a vigília depois que o transmissor foi lacrado, entrevistando trabalhadores que permaneciam no local... Os canais que pertenceram a TV Tupi seriam licitados em 1981... A  Tupi de São Paulo se transformou no SBT, e a Tupi do Rio se tornou a TV Manchete, depois Rede TV! O acervo da emissora paulistana foi transferido para a Cinemateca Brasileira – a TV Cultura fez uma cópia do material, que exibia com frequência em seus programas – e o material da estação carioca foi parar no Arquivo Nacional, que recentemente começou a disponibilizar vídeos para o público, vide usuários do Youtube © que vem postando material, principalmente programas de Flávio Cavalcanti... Há também o vídeo do substituto do programa de Flávio, "Domingo à Noite", uma versão dominical do "Aqui e Agora", apresentada por Wilton Franco, o próprio, exibida em rede nacional, ao contrário do programa matriz, exibido apenas no Rio de Janeiro...  O vídeo do último programa da Tupi do Rio, porém, é único pelo registro que faz, e que ganha ainda mais importância no ano em que se comemora o 70º aniversário da televisão brasileira... Então é por isso que o Seu Bloquinho Virtual o escolheu para iniciar uma série de postagens sobre os 70 anos de TV no país...

























































Antes do transmissor ser lacrado, foi mostrado um "slide" com o logotipo da emissora e uma mensagem de despedida... 

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